A leitura feminista realmente pode ajudar a vencer a anorexia. Funcionou comigo.
A leitura feminista realmente pode ajudar a vencer a anorexia. Funcionou comigo.

No meu caso, agradeço a Susie Orbach.

De acordo com um novo estudo, a teoria feminista pode ajudar a tratar a anorexia. Isso não é nenhuma surpresa para mim, baseada na minha própria experiência de tentar desaparecer, pulando uma refeição por vez. Pesquisadores da Universidade de East Anglia testaram um programa de 10 semanas com sete internos em um centro em Norwich, Inglaterra. Eles usaram filmes da Disney, mídias sociais, artigos de notícias e anúncios para falar sobre as expectativas sociais e as construções de gênero, como vemos os corpos das mulheres e como definimos a feminilidade. Eles falaram sobre a forma como retratamos o apetite, a fome e a raiva, bem como as maneiras como objetificamos os corpos das mulheres. .

Os pesquisadores publicaram um artigo na revista Eating Disorders que sugeriu que os pacientes melhoraram porque sentiram menos culpa por sua própria condição. Isso faz todo o sentido. Quando eu tinha 15 anos, passei seis semanas em uma clínica para transtornos alimentares em Sydney. Enquanto olhava para aquelas paredes de cor pistache pálida do meu quarto-cela, sentia que nunca mais me recuperaria. Eu e meus companheiros emaciados ficamos sob os cuidados de um ex-diretor de prisão transformado em enfermeiro de pacientes com transtornos alimentares, que garantiu que obedecessemos à nossa rigorosa rotina diária de três refeições, três lanches, duas sessões de terapia e o não uso das escadas para não perder calorias. Eu não estava sozinha naquele medo de ser eternamente doente; a recuperação é difícil para muitos dos que sofrem dessa doença, e talvez a parte mais cruel do processo é que a anorexia convence você a não querer melhorar.

Então, um dia, tivemos autorização para fazer uma excursão em grupo. Entramos em fila numa enorme livraria no último andar de um prédio. Fomos direcionados para a seção de auto-ajuda, mas desviei furtivamente para estudos de gênero. Ali, entre Naomi Wolfs e Germaine Greers, me senti estranhamente segura pra variar. Eu tenho apreço por livros, eu sempre tive, e eu lembro de acariciar suas lombadas com ternura, desejando algum tipo de orientação. Nos foi dito que deveríamos levar um livro naquele dia. Escolhi Hunger Strike [Greve de Fome] de Susie Orbach.

Originalmente publicado em 1986 (apenas um ano antes de eu nascer, uma coincidência que me atraiu), é um texto feminista inspirador sobre “a luta do anoréxico como uma metáfora para a nossa era”. Nele, Orbach argumenta que a anorexia é ao mesmo tempo uma luta profundamente privada e uma muito pública. Os corpos das mulheres, ela escreveu, ainda são considerados propriedade pública e, enquanto for assim, nosso desejo de diminuí-los é uma questão feminista.

Ler esse livro no hospital me afetou de uma maneira que nenhuma sessão de terapia cognitivo-comportamental de grupo jamais fez. Ele me deu permissão para procurar fora de mim pelas causas da minha doença e, assim como os participantes desse novo estudo, ousei pensar que não era culpada. A revelação mais útil na minha jornada de recuperação foi precisamente essa ideia: a anorexia existia fora de quem eu era fundamentalmente como pessoa. Era um tipo de exorcismo — algo tomou conta de mim e que devia ser dominado.

A anorexia é uma interação complexa de genética, traços de personalidade e vivência. Alguns cientistas sugerem que podemos estar geneticamente predispostos à doença; um tipo biológico de fatalismo que não necessariamente leva em consideração quão profundamente podemos ser afetados por algo como a percepção cultural de gênero. Às vezes, os tratamentos menos convencionais ajudam — arteterapia ou terapia musical, por exemplo, além de supervisão médica e um plano nutricional. Para mim, o bálsamo era a teoria feminista.

A anorexia é notoriamente difícil de tratar. Tem a maior taxa de mortalidade de qualquer doença mental, e pode levar uma média de três anos para se obter o tratamento adequado para isso. Há 1,25 milhões de pessoas só no Reino Unido vivendo com distúrbios alimentares e, em seu interesse, espero que possamos obter mais recursos para novos tratamentos como este.

Mas até então, aqui está uma lista de leitura para quem pode precisar: • Hunger Strike, Susie Orbach • Fat is a Feminist Issue, Susie Orbach • Bodies, Susie Orbach •O Mito da Beleza, Naomi Wolf• A Mulher Eunuco, Germaine Greer • A Mulher Comestível, Margaret Atwood • Unbearable Weight, Susan Bordo


Kate Leaver é jornalista freelancer e autora de The Friendship Cure

Traduzido de https://www.theguardian.com/commentisfree/2017/nov/16/feminist-reading-anorexia-books-susie-orbach