Dana Levy, que esteve na prostituição em Israel por vários anos, responde ao recente artigo da Dra. Tlaleng Mofokeng na Teen Vogue intitulado “Por que o trabalho sexual é um trabalho real”
(Tradução do texto de Dana Levy do Nordic Model Now!)
A Teen Vogue publicou recentemente um artigo da Dra. Tlaleng Mofokeng sob o título “Por que o trabalho sexual é um trabalho real”. Alerta de spoiler: o título é enganoso. Em grande parte, o artigo sequer finge responder à sua própria suposição. O único argumento que pode ser interpretado como uma espécie de resposta é que todos nós somos trabalhadores do sexo, de uma forma ou de outra: “Sou médica, especialista em saúde sexual, mas quando você pensa nisso, não sou uma profissional do sexo? E, de certa forma, não somos todos?”.
Portanto, de acordo com Mofokeng, o trabalho sexual é um trabalho real. Isso é obviamente ridículo, mas eu prefiro olhar para o copo meio cheio aqui — isso demonstra de forma gloriosa o quão absurdo é o eufemismo “trabalho sexual”.
O termo “trabalho sexual”, que muitos usam alternadamente com “prostituição”, é um termo abrangente que agrupa não apenas prostitutas, mas também modelos nuas, strippers e até cafetões. Parece que a Dra. Mofokeng os considera um grupo muito obscuro para categorizar o que fazem como ‘trabalho real’, então ela empurra esses limites ainda mais para incluir a si própria.
Ela comenta: “Eu acho interessante que, como médica, eu troque o pagamento em dinheiro com pessoas para fornecer conselhos e tratamento para problemas relacionados ao sexo; terapia para o desempenho sexual, aconselhamento e terapia para problemas de relacionamento e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis. Isso não é basicamente trabalho sexual?”
Mesmo que seja uma pergunta retórica, eu corria o risco de responder a ela que eu não sei.
O movimento abolicionista não reconhece o termo “trabalho sexual”. Nós não achamos que um médico, um cafetão e as mulheres prostituídas compartilham interesses comuns. Nós nos opomos ao ato da prostituição — isto é, a prática que permite que um homem compre o direito de forçar seu pênis em uma mulher em outro caso desinteressada, ou mesmo com repulsa. A doutora pode ter certeza — o modelo nórdico não lida com os clientes dela.
O resto do artigo é dedicado a se opor à criminalização de pessoas na prostituição, como ocorre em seu país, a África do Sul. A Dra. Mofokeng olha com muito interesse para a descriminalização na Holanda. A extensão de seu conhecimento dos outros modelos legais não é clara ou talvez inexistente. Ela não reconhece nenhuma das opções do espectro entre a total criminalização da África do Sul e o caloroso abraço institucionalizado dado à indústria do sexo pelos Países Baixos. Se essas outras opções não existissem, eu também preferiria a regulação.
A Doutora tenta explicar porque criminalizar as pessoas na prostituição está errado, enquanto não dá uma explicação coerente. Ela comenta: “Eu não acredito que seja certo ou apenas que as pessoas que trocam serviços sexuais por dinheiro sejam criminalizadas e eu não sou pelo que faço.”
Esta não é, obviamente, uma razão satisfatória — o fato de seu trabalho não ser prejudicial à comunidade não é suficiente para argumentar o mesmo para todos os outros. A razão para se abster de criminalizar as pessoas na prostituição é a sua vulnerabilidade, não simplesmente o fato de estarem fazendo isso por dinheiro.
Prostitutas definitivamente precisam de proteção contra a violência individual e institucionalizada, e é aí que eu concordo com Mofokeng. Mas a “descriminalização” envolve legitimar os compradores, os cafetões e também outros segmentos exploradores do meio.
A escritora não se incomoda com a moralidade de regulamentar a cafetinagem: é o suficiente para ela, que “é apoiada por organizações de trabalho sexual”. O problema é que as ‘organizações de trabalho sexual’ não representam necessariamente os interesses da comunidade. Além disso, eles não representam a maioria da população na prostituição, mas sim um pequeno grupo que se auto-descreve como “profissionais do sexo” e outros, nem mesmo na prostituição, como as cafetinas e os cafetões. Esta não é uma teoria da conspiração. Os sites de “organizações de trabalhadores do sexo” em todo o mundo representam, sem remorsos, os interesses dos “empregadores” e “gerentes”.
Eu sei que algumas pessoas na prostituição apoiam a descriminalização de seus cafetões e cafetinas, a quem eles se referem como gerentes e consideram ter um negócio legítimo. Eu entendo o ponto de vista delas.
Às vezes, para permanecer são, você deve normalizar, reprimir, dizer que está tudo bem — pelo menos até que esteja em uma posição suficientemente segura para reconhecer o que lhe foi feito. Eu também estive nesse lugar.
Mas o apoio à descriminalização total, que faz da indústria do sexo um negócio financeiramente legítimo, não é compartilhado pela maioria das pessoas na prostituição. A maioria das prostitutas não está interessada em um status profissional que as exponha a autoridades fiscais e de outros tipos. Elas estão interessadas em serviços que as ajudem a sair, que praticamente não existem nos países com descriminalização, porque quem precisa de reabilitação de um“trabalho real”? No pior caso, você muda as condições do emprego.
A indústria do sexo, que mexe com trilhões de dólares por ano, tem muito dinheiro para investir. Parte disso é gasto em autopromoção, o que inclui apresentar cafetões e cafetinas da própria descriminalização como um interesse essencial para prostitutas e apresentando a prostituição como um “trabalho normal”. Mas todas sabemos que, em última análise, a prostituição não é um “trabalho normal”. Até a Dra. Mofokeng sabe disso. Ela pode falar o que quiser sobre seu aconselhamento médico como “trabalho sexual”, mas recusaria um contrato de trabalho que exija que ela trabalhe em um bordel. Se ela alguma vez trabalhar com um supervisor que condiciona seu emprego a fazer sexo com ele, ela saberá chamar isso de “tentativa de estupro” ou “extorsão sexual”, e não “extensão dos deveres”.
Aqueles que podem se achar mais confusos neste labirinto de conceitos são as meninas jovens, especialmente aquelas que vêm de um contexto de pobreza e disfunção familiar. O lobby da indústria do sexo apresenta a prostituição como uma ferramenta de mobilidade social para as mulheres pobres. O mito do “dinheiro fácil” chega ao coração das adolescentes.
Essas meninas não sabem que uma mulher pobre que se prostitui não sai rica, mas se encontra em uma década ou duas depois, muito mais pobre, fisicamente e mentalmente doente, disfuncional, vivendo à margem da sociedade, sem alternativas de emprego. Quando isso acontece com a próxima garota que está convencida de que a prostituição irá enriquecê-la e empoderá-la, a equipe da Teen Vogue não estará lá para reabilitá-la. Portanto, eu esperaria que a revista tivesse a mínima responsabilidade social e não desse uma plataforma para esse absurdo perigoso sem qualquer crítica ou contrapeso.
Terminarei citando Mickey Meji, uma corajosa sobrevivente de prostituição do país da Dra. Tlaleng Mofokeng, África do Sul:
“As mulheres na prostituição não acordam um dia e ‘escolhem’ ser prostituídas. A prostituição é escolhida para elas pelo nosso passado colonial e apartheid, desigualdades persistentes, pobreza, passado sexual e abuso físico, os cafetões que se aproveitam das nossas vulnerabilidades e os homens que nos compram na prostituição. Concordo que aquelas que vendem sexo devem ser descriminalizadas, mas não há base para descriminalizar aqueles que compram sexo, e aqueles que vendem mulheres e meninas (cafetões e proprietários de bordéis). Eles devem permanecer criminalizados. Eles não devem receber uma licença para explorar uma posição de vulnerabilidade causada pela desigualdade de gênero, desemprego e pobreza.”