Dores do crescimento. A puberdade pode ser descartável?

Introdução

Controvérsias públicas a respeito da forma como instituições deveriam tratar indivíduos que se identificam com um gênero que não corresponde a seu sexo biológico têm sido debatidas, recentemente, nos salões governamentais, em juízo e em talk shows da televisão. Machos que se identificam como mulheres deveriam ter acesso ao banheiro feminino? Qual vestiário meninas que se identificam como meninos deveriam ser permitidas — ou requisitadas — a usar? Docentes devem ser obrigados a usar o pronome de preferência do estudante, ou mesmo um pronome neutro como “ze” ao invés de “he” (ele) ou “she” (ela)?

Juntamente a essas questões de interesse público, entretanto, há questões mais silenciosas de medicina e de bem estar. Como profissionais de saúde e de saúde mental deveriam cuidar de pacientes que se identificam com o sexo oposto, e como as famílias deveriam apoiar pessoas queridas que também o fazem? As apostas são altas: como foi detalhado em um informe recente dessa revista, pessoas que se identificam como transgêneras possuem uma tendência desproporcional a sofrer de uma grande gama de problemas de saúde mental, incluindo depressão, ansiedade, tentativas de suicídio e o próprio suicídio. [1]

Psiquiatras que seguem o Manual de Estatística e Diagnóstico da Associação Americana de Psiquiatria utilizam o termo “disforia de gênero” para uma condição em que a “incongruência entre o gênero vivenciado/expressado e o gênero designado de alguém” é acompanhada por “estresse clinicamente significante ou prejuízos nas funções social, ocupacional, e outras funções importantes” [2]. Nesse contexto, “gênero vivenciado/expressado” refere-se ao gênero com que a pessoa subjetivamente se identifica ou como quer ser publicamente reconhecida — o que é geralmente denominado “identidade de gênero” — enquanto que o “gênero designado” refere-se em quase todos os casos ao sexo biológico inequívoco da pessoa. (Em alguns casos raros, o sexo biológico da pessoa é difícil de se determinar; indivíduos “intersexo” nascem com características biológicas de ambos os sexos. A maioria das pessoas transgêneras não são biologicamente intersexo. [3])

Há surpreendentemente pouco entendimento científico de questões importantes subjacentes aos debates acerca da identidade de gênero — por exemplo, há pouca evidência científica explicando por que algumas pessoas se identificam como sendo do sexo oposto, ou por que expressões durante a infância de uma identificação com o gênero oposto persistem em algumas pessoas e não em outras. [4] Ainda assim, não obstante a insuficiência de dados, profissionais da medicina e de saúde mental chegaram a inúmeros métodos para tratar crianças, adolescentes e pessoas adultas com “disforia de gênero”.

Uma preocupação específica é o manejo da disforia de gênero em crianças. Pessoas jovens com disforia de gênero constituem uma população especialmente vulnerável; uma que vivencia altas taxas de depressão, auto-mutilação, e até suicídio. [5] Além disso, crianças não são totalmente capazes de entender o que significa ser homem ou ser mulher. A maioria das crianças com problemas de identidade de gênero eventualmente aceitam o gênero associado com seu sexo e param de se identificar com o sexo oposto. [6] Há evidência, entretanto, de que disforia de gênero e identificação com o gênero oposto tornam-se mais persistentes se elas perduram pela adolescência. [7]

Em uma abordagem de tratamento proeminente, chamada “afirmação de gênero”, o terapeuta aceita, ao invés de discutir, o entendimento de si do paciente de ser do sexo oposto. Modelos de terapia de “afirmação de gênero” às vezes são aplicados até para crianças bem jovens. [8] Frequentemente, abordagens de afirmação de gênero são seguidas no início da vida adulta por intervenções hormonais e cirúrgicas que visam fazer com que a aparência do/da paciente se alinhe com sua identidade de gênero (ao invés de seu sexo biológico). Para aumentar o sucesso das mudanças físicas, intervenções mais precoces têm sido cada vez mais recomendadas [9].

Clínicas de identidade de gênero que oferecem psicoterapia de afirmação de gênero para crianças e adolescentes têm sido abertas nos Estados Unidos e em diversos outros países. [10] Apesar de haver poucos dados sistematicamente coletados sore o número de pessoas jovens (ou mesmo o número de pessoas adultas) que se identificam como transgêneras ou que se submeteram à cirurgia de redesignação de sexo, [*] há alguma evidência de que o número de pessoas recebendo cuidados médicos e psicoterápicos para questões de identidade de gênero estejam aumentando:

  • O Serviço de Desenvolvimento de Identidade de Gênero no Reino Unido, que trata somente de pessoas menores de 18 anos, informa que recebeu 94 encaminhamentos sobre jovens em 2009/2010 e 1.986 encaminhamentos de jovens em 2016/2017 — um aumento de 2.000%. [11] O serviço também informa que recebeu 6 encaminhamentos de crianças menores de 6 anos em 2009/2010, comparadas a 32 encaminhamentos para crianças menores de 6 anos em 2016/2017 — um aumento de 430%. [12]
  • Em um estudo de psicólogos de uma clínica de gênero em Toronto, os autores reportaram um grande aumento no número de encaminhamentos para crianças (de 3 a 12 anos) por ano entre 1988 e 1991, então o número de crianças encaminhadas subiu de 40 por ano, em média, para 80, uma taxa que permaneceu estável ao longo de 2011. [13] Os autores também reportam que entre 2004 e 2007, a taxa de adolescentes (de 13 a 20 anos) encaminhados à clínica aumentou de aproximadamente 20 por ano para 60, e então para quase 100 por ano em 2011. [14]
  • Em um estudo de clínicos no Hospital Infantil de Boston, os autores reportaram o número de pessoas que se apresentaram ao hospital com problemas de identidade de gênero. Entre 1996 e 2006, tais pacientes se apresentavam à divisão de endocrinologia do hospital em uma taxa de 4,5 pacientes por ano; mas, no período de 2007 a 2009, após o hospital abrir uma clínica de identidade de gênero, a média anual de pacientes se apresentando com problemas de identidade de gênero subiu para 19 pacientes por ano.
  • Em um trabalho publicado em 2016, médicos de uma clínica endocrinológico-pediátrica de Indianápolis reportaram um “aumento dramático” nos encaminhamentos para disforia de gênero desde 2002, descobrindo que de 38 pacientes encaminhados entre 2002 e 2015, “74% haviam sido encaminhados nos últimos 3 anos” [16]. Os autores enfatizam que sua clínica não se especializa em disforia de gênero, e que “o marcante aumento no número de novos pacientes vistos em nossa clínica nos últimos 3 anos tem ocorrido mesmo que nossa base de encaminhamentos não tenha mudado, e nossa clínica não tem feito propagandas específicas de cuidados para pacientes transgêneros”. [17]

As razões para esse aumento de taxas é incerta. Pode ser que a conscientização social acerca da disforia de gênero tenha feito pais e mães mais dispostos a buscar ajuda médica para suas crianças. (Nós devemos nos lembrar de que são os pais ou guardiões, não as próprias crianças, que tomam decisões acerca de cuidado médico). Entretanto, os tratamentos médicos providos a crianças com sintomas aparentes de disforia de gênero, incluindo a afirmação da expressão de gênero desde a mais precoce evidência de comportamentos do gênero oposto, podem levar algumas crianças a persistir na identificação de transgênero quando elas poderiam, do contrário, se conformar com seu gênero conforme crescessem. A identidade de gênero das crianças é elástica (ou seja, pode mudar ao longo do tempo) e plástica (ou seja, pode ser moldada por forças como a aprovação parental e condições sociais) [18]. Se o crescente uso de cuidados de afirmação de gênero de fato leva crianças a persistir com sua identificação com o sexo oposto, então muitas crianças que, de outra forma, não necessitariam de tratamentos médicos são expostas a intervenções hormonais e cirúrgicas.

Uma intervenção particular de afirmação de gênero para crianças e jovens adolescentes com a disforia de gênero é a supressão da puberdade (também conhecida como bloqueadores de puberdade) — uma intervenção hormonal que previne a progressão normal da puberdade. A puberdade é um momento turbulento na vida de qualquer pessoa, e pode ser assustador para aquelas pessoas que se identificam com o sexo oposto. Para pais de crianças com disforia de gênero, a supressão de gênero pode parecer muito atrativa. Parece oferecer uma solução médica para a confusão, a ansiedade e o estresse antecipados, freando o desenvolvimento das características mais notáveis do sexo biológico da criança. A supressão da puberdade parece oferecer um passo intermediário entre a afirmação social que os pais podem oferecer a crianças muito jovens e procedimentos de redesignação de sexo que seus filhos podem buscar quando tiverem crescido. E parece oferecer uma forma de mitigar a discordância entre a crença da criança a respeito de seu gênero e a realidade de seu desenvolvimento corporal (enquanto aquiesce, ao invés de desafiar, a compreensão de si que a criança tem). A supressão da puberdade pode, resumidamente, parecer-se com uma passagem segura dos tempestuosos mares das expressões infantis de crenças a respeito do gênero para o porto seguro de uma vida adulta vivida permanentemente como sexo oposto.

À luz da crescente proeminência das questões de identidade de gênero em nossa sociedade, e o apelo que a supressão da puberdade pode ter para pais criando suas crianças que se identificam com o sexo oposto, vale a pena examinar em detalhes o que é a supressão da puberdade, como funciona, e se é segura e prudente como seus defensores alegam. Como veremos, as evidências para a segurança e a eficácia da supressão da puberdade são pequenas, baseadas mais em julgamentos subjetivos de clínicos do que em evidências empíricas rigorosas. É, nesse sentido, ainda experimental — e, ainda, assim, é um experimento sendo conduzido de uma maneira descontrolada e assistemática.

O que é a puberdade?

Tendo vivenciado a adolescência e as mudanças tumultuosas que ela envolve, a maioria dos adultos é familiar de uma maneira muito pessoal com a puberdade. Mas falar das questões envolvendo intervenções de bloqueio da puberdade para disforia de gênero requer o entendimento de como a puberdade é definida e compreendida na biologia e na medicina. Alguns fatos fundamentais sobre a puberdade ainda são desconhecidos; nas palavras de um livro médico, “introdução ao início da puberdade tem sido um mistério há tempos” [19]. Mas, de forma geral, os principais aspectos da puberdade são bem compreendidos.

O capítulo de um livro de William A. Marshall e James M. Tanner (a partir de quem a escala Tanner, uma medida detalhada dos estágios do desenvolvimento puberal, é nomeada) descreve a puberdade como “as mudanças fisiológicas e morfológicas que ocorrem na menina ou menino em crescimento conforme as gônadas mudam de infantis para o estado adulto. Essas mudanças envolvem quase todos os órgãos e estruturas do corpo, mas não começam na mesma idade nem tomam o mesmo tempo para se completarem em todas as pessoas. A puberdade não está completa até que o indivíduo tenha adquirido a capacidade física de conceber e de criar uma criança com êxito.” [20] Os autores continuam com a lista das principais manifestações da puberdade:

1. O estirão de crescimento adolescente; por exemplo, uma aceleração seguida por desaceleração do crescimento principalmente em dimensões ósseas e em vários órgãos internos.

2. O desenvolvimento das gônadas.

3. O desenvolvimento dos órgãos reprodutivos secundários e das características sexuais secundárias.

4. Mudanças na composição do corpo; por exemplo, na quantidade e na distribuição de gordura em associação com o crescimento do esqueleto e da musculatura.

5. Desenvolvimento dos sistemas circulatório e respiratório levando, particularmente em meninos, ao aumento da força e da resistência física. [21]

A habilidade de fisicamente conceber crianças é possibilitada pela maturação das características sexuais primárias, dos órgãos e das estruturas envolvidas diretamente na reprodução. Em meninos, esses órgãos e estruturas incluem o escroto, testículos e pênis, enquanto que nas meninas elas incluem os ovários, o útero e a vagina. Em adição a essas características sexuais primárias, características secundárias também se desenvolvem durante a puberdade — as características físicas particulares dos dois sexos que não estão diretamente envolvidas na reprodução. Características sexuais secundárias que se desenvolvem nas meninas incluem “o crescimento dos seios e o alargamento do quadril” e, nos meninos, “o aparecimento de pelos faciais e o alargamento dos ombros”, enquanto que outros padrões de pelos corporais e mudanças na voz e na pele ocorrem durante a puberdade em ambos os sexos. [22]

Médicos caracterizam o progresso da puberdade marcando o início de diferentes marcos desenvolvimentais. O evento visível mais precoce, o crescimento inicial de pelos pubianos, é conhecido como “pubarca”; ocorre entre os 8 e 13 anos em meninas e entre os 9,5 e 13,5 anos em meninos. [23] Nas meninas, o início do desenvolvimento dos seios, conhecido como “telarca”, ocorre aproximadamente ao mesmo tempo em que a pubarca. [24] (O sufixo “-arca” nos termos para esses marcos vem do termo grego para início ou origem) “Menarca” é outra manifestação da maturação sexual nas fêmeas, referindo-se ao início da menstruação, o que tipicamente ocorre em torno dos 13 anos de idade e é geralmente um sinal da habilidade de conceber. [25] Grosseiramente correspondente à menarca das meninas é a “espermarca” nos meninos; refere-se à presença inicial de esperma viável no sêmen, o que também tipicamente ocorre por volta dos 13 anos. [26]

Hormônios e Puberdade

Estabelecido o que é a puberdade, agora vamos nos voltar para como a puberdade acontece.

Cientistas distinguem três principais processos biológicos envolvidos na puberdade: maturação adrenal, maturação gonadal e aceleração do crescimento somático. [27] Discutiremos cada um desses processos por vez, com foco especial na maturação gonadal.

A “adrenarca” — o começo da maturação adrenal — começa entre os 6 e os 9 anos nas meninas e entre os 7 e 10 anos nos meninos. Os hormônios produzidos pelas glândulas adrenais durante a adrenarca são formas relativamente fracas de hormônios masculinizantes, conhecidos como desidroepiandrosterona (prasterona ou DHEA) e sulfato de dehidroepiandrosterona (S-DHEA). Esses hormônios são responsáveis por sinais da puberdade compartilhados por ambos os sexos: pele oleosa, acne, odores corporais e o crescimento dos pelos axilares e púbicos. [28]

A “gonadarca” — o início do processo de maturação das gônadas — normalmente ocorre nas meninas entre os 8 e 13 anos e nos meninos entre os 9 e 14 anos. [29] O processo começa no cérebro, onde neurônios especializados no hipotálamo secretam hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH). [30] Esse hormônio é secretado de maneira cíclica ou “pulsátil” [31] — o hipotálamo libera explosões de GnRH, e quando a glândula pituitária é exposta a essas explosões, responde secretando dois outros hormônios. São eles o hormônio luteinizante (LH) e o hormônio folículo-estimulante (FSH), que estimulam o crescimento das gônadas (ovários nas mulheres e testículos nos homens). [32] (Os “folículos” estimulados pelo FSH não são folículos capilares mas ovarianos, as estruturas nos ovários que contêm células-ovo imaturas.) Em adição à regulação da maturação das gônadas e da produção de hormônios sexuais, esses dois hormônios também atuam de forma importante em regular aspectos da fertilidade humana [33] — mas, para os propósitos presentes, vamos nos focar no seu papel no desenvolvimento das gônadas e na produção de hormônios sexuais durante a puberdade.

Conforme as células gonadais amadurecem sob a influência do LH e do FSH, elas começam a secretar androgênios (hormônios sexuais masculinizantes, como a testosterona) e estrogênios (hormônios sexuais feminilizantes) [34]. Esses hormônios contribuem com o posterior desenvolvimento das características sexuais primárias (o útero nas meninas e o pênis e o escroto nos meninos) e com o desenvolvimento das características sexuais secundárias (inclusive seios maiores e quadril mais largo nas meninas, e ombros mais largos, voz mais grossa e maior massa muscular em meninos). Os ovários e testículos ambos secretam androgênios e estrogênios; entretanto, os testículos secretam mais androgênios e os ovários, mas estrogênios. [35]

As gônadas e as glândulas adrenais estão envolvidas em dois caminhos (ou “eixos”) separados, mas interligados, de sinalização hormonal. São elas o eixo hipotalâmico hipofisário gonadal (HPG) e o eixo hipotálamo hipofisário adrenal (HPA) [36]. Apesar de ambos terem papéis essenciais na puberdade, é o eixo HPG que resulta no desenvolvimento da capacidade reprodutiva básica e das características sexuais externas que distinguem os sexos. [37]

O terceiro processo significante que ocorre na puberdade — o estirão de crescimento somático — é mediado pelo aumento da produção e da secreção do hormônio de crescimento humano, o qual é influenciado pelos hormônios sexuais secretados pelas gônadas (ambos a testosterona e o estrogênio). Similarmente à forma como a secreção de GnRH pelo hipotálamo faz a hipófise liberar FSH e LH, nesse caso, pulsos curtos de um hormônio secretado pelo hipotálamo faz a hipófise liberar hormônio do crescimento. [38] Esse processo é aumentado pela testosterona e pelo estrogênio. [39] O hormônio do crescimento age diretamente estimulando o crescimento em certos tecidos, e também estimula o fígado a produzir uma substância chamada “fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1” (ou somatomedina C ou IGF-1), que tem efeitos de estímulo ao crescimento nos músculos. [40]

As mudanças neurológicas e psicológicas que ocorrem na puberdade são menos compreendidas do que as mudanças fisiológicas. Homens e mulheres possuem características neurológicas distintas que podem explicar algumas das diferenças psicológicas entre os sexos, mas o quanto as diferenças neurológicas explicam as diferenças psicológicas e o quanto as diferenças neurológicas são causadas por fatores biológicos como hormônios e genes (em oposição a fatores como o condicionamento social) são todas matérias de debate. [41]

Cientistas fazem a distinção entre dois tipos de efeitos que hormônios podem ter no cérebro: efeitos organizacionais e efeitos ativacionais. Efeitos organizacionais são as formas como hormônios causam mudanças altamente sólidas na arquitetura básica de diferentes regiões cerebrais. Efeitos ativacionais são efeitos hormonais mais imediatos e temporários na atividade do cérebro. Durante a puberdade, androgênios e estrogênios primariamente possuem efeitos ativacionais, mas muito antes disso eles possuem efeitos organizacionais nos cérebros de crianças em desenvolvimento e em fetos. [42] (Alguns pesquisadores especulam que a identificação com o gênero oposto possa ser causada por padrões atípicos de exposição fetal a hormônios sexuais, mas essas teorias ainda necessitam de confirmação científica e mesmo de testes sérios. [43] ) Entretanto, estudos animais têm fornecido alguma evidência de que hormônios sexuais podem contribuir para efeitos organizacionais (ou reorganização) no cérebro durante a puberdade. [44] Como, se, e até que ponto esse processo ocorre em humanos ainda é pouco compreendido. [45]

Em suma: a puberdade envolve uma miríade de processos físicos complexos, relacionados e sobrepostos, ocorrendo em vários pontos e durando por diferentes períodos. A adrenarca e a secreção de hormônios de crescimento contribuem com o crescimento e o desenvolvimento da criança, enquanto que a gonadarca crucialmente leva à maturação dos órgãos sexuais que permitem a reprodução, assim como o desenvolvimento de outras características biológicas que distinguem machos de gêmeas. A descrição oferecida aqui foi muito simplificada, é claro, mas fornece pano de fundo suficiente para entender o funcionamento da supressão da puberdade, a qual veremos a seguir.

As origens das técnicas de supressão da puberdade

Intervenções hormonais para suprimir a puberdade não foram desenvolvidas com o propósito de tratar crianças com disforia de gênero — ao invés disso, elas foram primariamente usadas como uma forma de regularizar a puberdade para crianças que chegam à puberdade cedo demais, uma condição conhecida como “puberdade precoce”.

Para fêmeas, a puberdade precoce é definida pelo começo da puberdade antes dos 8 anos, enquanto que para meninos é definida pelo começo da puberdade antes dos 9 anos [46]. A telarca prematura (o aparecimento do desenvolvimento dos seios) é normalmente o primeiro sinal clínico da puberdade precoce em meninas. Para machos, a puberdade precoce é marcada pelo crescimento prematuro da genitália e dos pelos pubianos. [47] Em adição às consequências psicológicas e sociais que se espera que a criança sofra, a puberdade precoce pode levar a uma altura reduzida, já que a entrada antecipada na puberdade interfere com o posterior crescimento dos ossos. [48]

A puberdade precoce é dividida em dois tipos: a puberdade precoce central (às vezes rotulada “puberdade precoce real”) e a puberdade precoce periférica (às vezes rotulada “pseudopuberdade precoce”). [49] A puberdade precoce central é causada pela ativação antecipada do eixo hormonal gonadal pelo GnRH, e é passível de tratamento médico. A puberdade precoce periférica, que é causada pela secreção de hormônios sexuais pelas gônadas ou glândulas adrenais independentemente de sinais da hipófise, é mais difícil de se tratar. [50] A puberdade precoce é rara, especialmente em meninos. Um estudo espanhol recente de puberdade precoce central estimou a prevalência geral em 19 para 100.000 pessoas (37 em 100.000 meninas afetadas, e 0,46 em 100.000 meninos). [51] Um estudo dinamarquês sobre a puberdade precoce (não limitada à puberdade precoce central) descobriu a prevalência em 20 a 23 meninas a cada 10.000 e menos de 5 meninos a cada 10.000. [52]

O tratamento para a puberdade precoce é relativamente contraintuitivo. Ao invés de parar a produção de GnRH, médicos, na verdade, fornecem a pacientes níveis mais constantes de GnRH sintético (chamado análogos de GnRH ou GnRH agonista). [53] O GnRH adicional torna a hipófise insensível, levando à diminuição da secreção de gonadotrofinas (LH e FSH), o que, por sua vez, leva à diminuição da maturação e da secreção de hormônios sexuais pelas gônadas (ovários e testículos). A primeira publicação descrevendo o uso de análogos de GnRH em crianças apareceu em 1981. [54]

O processo de insensibilização da hipófise pelo GnRH sintético não é permanente. Assim que um paciente para de tomar os análogos de GnRH, a hipófise vai voltar a responder normalmente à secreção pulsátil de GnRH pelo hipotálamo, como evidenciado pelo fato de que crianças tratadas para puberdade precoce usando análogos de GnRH retomam o desenvolvimento puberal normal geralmente um ano depois do fim do tratamento. [55]

Desde que os análogos de GnRH foram propostos pela primeira vez no início da década de 80, eles se tornaram relativamente bem aceitos como tratamento para puberdade precoce, com um análogo GnRH mais proeminente, Lupron, aprovado para seu uso pela FDA (Food and Drug Administration, comparável à ANVISA no Brasil) em 1993. [56] Entretanto, ainda restam algumas questões a respeito da efetividade do tratamento com análogos de GnRH. Uma declaração consensual recente de endocrinologistas pediatras concluiu que análogos de GnRH também são um forma efetiva de aumentar a altura de meninas cuja puberdade se iniciou antes dos 6 anos, e também se recomendou que se considerasse o tratamento para meninos com puberdade precoce que possam ter sua altura potencial comprometida. [57] Apesar dos resultados psicológicos e sociais negativos associados à puberdade precoce, os autores acreditaram que os dados disponíveis não eram convincentes, e que estudos adicionais eram necessários. [58]

Vale ressaltar que o uso de análogos de GnRH tem sido considerado em outros contextos também — por exemplo, em alguns casos de crianças com dificuldades severas de aprendizagem, para facilitar as dificuldades que essas crianças e seus cuidadores podem vivenciar na puberdade. [59] GnRH sintético para insensibilizar a hipófise também tem sido adaptado para tratar uma larga variedade de outras condições relacionadas à secreção de hormônios sexuais em adultos, incluindo o câncer de próstata [60] e problemas de fertilidade. [61] Isso porque a liberação pulsátil normal de GnRH continua tendo um papel importante depois da puberdade, porque estimula a hipófise a secretar gonadotrofinas que estimulam as gônadas a secretar hormônios sexuais dos testículos e dos ovários. [62]

Para sumarizar como a supressão da puberdade funciona, um experimento mental pode ser útil. Imagine dois pares de gêmeos idênticos normais biológica e psicologicamente — um par de meninas e um par de meninos — em que uma criança de cada par passa pela supressão da puberdade e a outra criança, não. Médicos começam a administrar tratamentos de análogos de GnRH, digamos, aos 8 anos, e para o menino, aos 9. Parar o eixo hormonal gonadal da puberdade não para o tempo, então as crianças com puberdade suprimida continuarão a envelhecer e a crescer — e porque hormônios adrenais associados com a puberdade não serão afetados, as crianças recebendo análogos de GnRH até passarão por algumas das mudanças associadas à puberdade, como o crescimento de pelos pubianos. Entretanto, haverá mudanças óbvias enormes entre cada par de gêmeos. Os órgãos reprodutivos das crianças com supressão não vão amadurecer: os testículos e pênis do menino sob supressão de puberdade não vão amadurecer, e a menina sob supressão não vai menstruar. O menino sob supressão vai ter menos massa muscular e ombros mais estreitos que seu gêmeo, enquanto que os seios da menina sob supressão não se desenvolverão. O menino e a menina sob supressão não terão o mesmo estirão de crescimento que seus gêmeos. Enfim, no momento em que os gêmeos não tratados chegarem à maturidade, tiverem aparência de adultos e tiverem a capacidade de ter crianças, os gêmeos sob supressão serão vários centímetros mais baixos, terão aparência física mais andrógina e infantil, e não serão biologicamente capazes de ter crianças. É apenas um experimento mental, mas ilustra alguns dos efeitos que se espera que a supressão da puberdade tenha no desenvolvimento do corpo de um adolescente em crescimento.

Um grande número de associações médicas e grupos de apoio têm afirmado que a supressão da puberdade é uma forma prudente e compassiva de ajudar a juventude que sofre de disforia de gênero. Em 2009, a Sociedade de Endocrinologia — uma organização internacional de profissionais que lidam com os hormônios corporais — publicou diretrizes para o tratamento de pessoas transexuais, recomendando que “adolescentes que preencham critérios de eligibilidade e prontidão para readequação de gênero inicialmente se submetam a tratamentos para suprimir o desenvolvimento da puberdade”. [63]

Dois anos depois, a Sociedade de Endocrinologia fez parceria com outras organizações — a Associação Profissional Mundial para Saúde de Transgêneros, a Sociedade Europeia de Endocrinologia, a Sociedade Europeia de Endocrinologia Pediátrica, e a Sociedade de Endocrinologia Pediátrica — para circular outro conjunto de diretrizes para o tratamento de pessoas transgênero. [64] Três observações foram feitas nas diretrizes para justificar a supressão da puberdade. Primeiro, a disforia de gênero “dificilmente desaparece após o início do desenvolvimento puberal” e, adicionalmente, “a supressão não causa mudanças danosas ou irreversíveis no desenvolvimento físico e a puberdade é retomada prontamente se a supressão hormonal é interrompida”. [65] Em segundo lugar, as mudanças físicas típicas da puberdade são “frequentemente associadas com a piora da disforia de gênero”, o que “foi revertido com a supressão da puberdade”. [66] Por fim, a modificação das características sexuais secundárias por tratamentos hormonais “é mais fácil e segura quando os esteroides sexuais do sexo genético da pessoa adolescente e seus efeitos — virilização e aumento dos seios, por exemplo — não estão presentes”. [67]

A Associação Profissional Mundial para a Saúde de Transgêneros (WPATH, uma associação para profissionais de saúde que lutam por assistência médica para transgêneros) também reafirma a supressão da puberdade em seus “Padrões de cuidado à saúde de pessoas transexuais, transgêneras e gênero-inconformadas” (2011), se presentes os seguintes critérios:

  1. O adolescente ter demonstrado um padrão intenso e duradouro de inconformidade de gênero ou disforia de gênero (tanto suprimido quanto expresso);
  2. A disforia de gênero ter aparecido ou piorado com o início da puberdade;
  3. Qualquer problema psicológico, médico ou social coexistente que pudesse interferir no tratamento (por exemplo, que pudesse comprometer a aderência ao tratamento) já estar sendo cuidado, de forma que a situação e o funcionamento do adolescente sejam suficientemente estáveis para começar o tratamento;
  4. O adolescente ter consentido de forma consciente e informada, e, particularmente, quando o adolescente não tiver alcançado a idade de consentimento médico, os pais ou outros cuidadores ou guardiões terem consentido ao tratamento e estão envolvidos para apoiar o adolescente durante o processo de tratamento. [68]

Os “Padrões de cuidado” da WPATH fornecem as duas justificativas seguintes para intervenções de supressão da puberdade: “(i) seu uso dá mais tempo para adolescentes explorarem sua inconformidade de gênero e outras questões de desenvolvimento; e (ii) seu uso pode facilitar a transição (para viver como o sexo oposto) por meio da prevenção do desenvolvimento de características sexuais que são difíceis ou impossíveis de reverter se o adolescente persistir na redesignação de sexo”. [69]

Em 2016, a Campanha de Direitos Humanos, um grupo de apoio a LGBT, associou-se à Academia Americana de Pediatria — a organização profissional de pediatras mais proeminente da nação — e à Universidade Americana de Pediatria Osteopática para publicar um guia para famílias de crianças transgênero. O guia diz que “para prevenir as consequências de passar por uma puberdade que não se alinha à identidade de gênero da criança, provedores de cuidados de saúde podem utilizar medicações completamente reversíveis que colocam uma pausa na puberdade”. [70] Atrasar a puberdade, de acordo com o guia, fornece tempo para a criança e a família “explorarem sentimentos e opções relacionados ao gênero”. [71]

Ler esses diversos guias dá a impressão de que há um consenso científico bem estabelecido acerca da segurança e da eficácia do uso de agentes bloqueadores de puberdade para crianças com disforia de gênero, e que pais dessas crianças deveriam considerá-los uma opção de tratamento prudente e cientificamente comprovada. Mas se a supressão da puberdade é a melhor forma de se tratar disforia de gênero em crianças, é algo que ainda está longe de estar resolvido; e deveria ser considerada não uma opção prudente com efetividade demonstrada, mas uma medida drástica e experimental.

Tratamentos médicos experimentais para crianças devem se sujeitar a escrutínio especialmente intenso, uma vez que crianças não podem prover consentimento legal para tratamentos médicos de qualquer espécie (pais ou guardiões devem consentir para que sua criança receba tratamentos), para não mencionar o consentimento a se tornar cobaia de pesquisa para testar uma terapia sem provas. No caso da disforia de gênero, entretanto, a segurança e a eficácia dos hormônios supressores não é bem fundamentada em evidência — apesar de intervenções hormonais usadas para a supressão da puberdade em crianças terem sido submetidas a testes, esses testes eram, como discutido, para outro tipo de indicação, como o retardamento da puberdade precoce. Se a supressão da puberdade é segura e efetiva quando usada para a disforia de gênero ainda é incerto e desprovido de evidência científica rigorosa. Isso é especialmente preocupante à luz da falta de entendimento das causas da disforia de gênero em crianças e em pessoas adultas. Condições como a puberdade precoce, por exemplo, têm um curso biológico que é relativamente bem compreendido. Intervenções hormonais que tratam dessa condição estão adaptadas a suas causas. No caso da disforia de gênero, entretanto, nós simplesmente não sabemos o que faz com que uma criança se identifique com o sexo oposto, então intervenções médicas, como a supressão da puberdade, não podem agir nisso diretamente.

Alguns médicos que usam a supressão da puberdade para tratar crianças com disforia de gênero argumentam que “a etiologia não afeta a forma como adolescentes com DG [disforia de gênero] deveriam ser tratados” [72] — ou seja, o tratamento da disforia de gênero não requer que primeiro entendamos suas causas. Em uma analogia oferecida por um psiquiatra anônimo entrevistado em um estudo das atitudes dos médicos sobre o assunto, “mesmo que você não saiba exatamente por que ou como uma pessoa quebrou sua perna”, é possível “compreender que é doloroso e debilita seu funcionamento” [73]. Apesar de existirem diferenças óbvias entre a importância da etiologia de machucados acidentais (como uma perna quebrada) e condições psicológicas persistentes (como a disforia de gênero), vale a pena pensar com cuidado nessa comparação. É verdade que cuidar de pacientes é importante independentemente da etiologia de suas condições. Entretanto, mesmo para um machucado como um osso quebrado, o médico deveria se interessar (por exemplo) se o paciente possui alguma condição que torna seus ossos mais quebradiços. Uma fratura óssea pode ser um sintoma de uma patologia subjacente como a osteoporose, e, nesses casos, diferentes cursos de tratamento podem ser indicados; o osso pode precisar descansar por mais tempo, e médicos geralmente recomendarão algumas mudanças de estilo de vida ou formas extensivas de tratamento para mitigar a condição subjacente e reduzir o risco de ferimentos futuros.

Se entendêssemos as causas subjacentes de disforia de gênero (ou mesmo os fatores que contribuem para o risco e a severidade da disforia de gênero, como a osteoporose é um fator de risco em fraturas ósseas), médicos seriam capazes de fazer diferentes tipos de recomendações a pacientes com o fim de mitigar a desconexão subjacente entre a identidade de gênero e o corpo de um paciente, reduzindo a severidade da disforia por eles experimentada. Todas as discussões de tratamentos apropriados para a disforia em adolescentes ou adultos estão sujeitas à qualificação de que abordagens terapêuticas completamente novas podem ser descobertas como resultado de aprimoramentos em nossa compreensão atualmente limitada da etiologia e do caminho da disforia de gênero.

A supressão da puberdade como uma intervenção para a disforia de gênero tem sido aceita tão rapidamente por grande parte da comunidade médica, aparentemente sem escrutínio científico, que se justifica a preocupação com o bem estar das crianças que lhe estão recebendo, assim como se justifica o questionamento da veracidade de algumas alegações feitas para apoiar seu uso — como a alegação de que é fisiológica e psicologicamente “reversível”. Para compreender melhor as opções de tratamento para crianças com disforia de gênero, vale a pena examinar as origens dessa abordagem e as justificativas oferecidas para ela.

Bloqueando a puberdade no tratamento de disforia de gênero

Durante os anos 80, ao mesmo tempo em que tratamentos para a puberdade precoce baseados em GnRH estavam sendo desenvolvidos, outro uso para a técnica estava sendo testado: suprimir a produção fisiológica normal de hormônios sexuais masculinos em homens adultos que se identificam como mulheres. Essa forma de redesignação sexual hormonal foi descrita pela primeira vez em 1981, quando médicos canadenses comunicaram seu uso de análogos-GnRH para suprimir a produção de andrógenos em quatro homens transexuais, de 18 a 29 anos. [74] Análogos de GnRH continuam a serem usados como parte de procedimentos de redesignação sexual para alguns pacientes homens fazendo a transição para mulheres. [75]

Somente nos anos 90 os análogos de GnRH chegaram a ser usados pela primeira vez para suprimir a puberdade em crianças que se identificavam como o sexo oposto. Em 1998, Peggy Cohen-Kettenis e Stephanie van Goozen, psicólogas em uma clínica de gênero holandesa, descreveram o caso de uma menina de 13 anos com disforia de gênero. O análogo de GnRH foi usado para suprimir a puberdade até que ela recebesse um diagnóstico definitivo de disforia de gênero aos 16 anos. (A “desordem de identidade de gênero”, à época, era o termo geralmente aceito para aquilo que hoje chamamos mais frequentemente de disforia de gênero, apesar de não serem idênticos) Aos 18 anos, ela se submeteu à cirurgia de redesignação sexual. [76] Os cientistas e médicos da clínica foram em frente para produzir um protocolo influente para o uso da supressão da puberdade como parte de uma abordagem terapêutica de afirmação de gênero para problemas de disforia de gênero e de identidade de gênero em adolescentes. Uma descrição do protocolo foi publicada no Periódico Europeu de Endocrinologia (European Journal of Endocrinology) em 2006, [77] com outro artigo descrevendo “entendimentos novos e inovadores” quanto ao uso da supressão da puberdade em adolescentes, publicado no Periódico de Medicina Sexual (Journal of Sexual Medicine) em 2008. [78]

O protocolo, comumente referido como o “protocolo holandês”, indica que a supressão da puberdade comece aos 12 anos após o diagnóstico de desordem de identidade de gênero. O protocolo estipula que o diagnóstico deve ser feito conjuntamente por um psicólogo e um psiquiatra, após a obtenção de informações de “ambos o adolescente e os pais sobre vários aspectos do desenvolvimento geral e psicossexual do adolescente, do comportamento atual do adolescente e do comportamento da família” [79]. O método dos pesquisadores para a supressão da puberdade era de injetar 3,75mg do análogo de GnRH triptorelina a cada quatro semanas. [80] Com esse regime, “não havia progressão do estágio puberal”, e “regressão das primeiras etapas das características sexuais já desenvolvidas”. Isso significava que, em meninas, “tecido mamário enfraquecerá e pode desaparecer completamente”, e, em meninos, “o volume testicular vai se reduzir a um volume menor”. [81]

Então, começando aos 16 anos, hormônios do sexo oposto são administrados enquanto se prossegue com o tratamento com análogo de GnRH, de forma a induzir algo como o processo de puberdade que normalmente ocorreria para membros do sexo oposto. Em pacientes transicionando para o sexo masculino, a administração de testosterona leva ao desenvolvimento de “uma voz grave, ao crescimento de pelos faciais e corporais, e uma aparência corporal mais masculina”, além do aumento do clitóris e do consequente atrofiamento do tecido mamário. [82] Em pacientes transicionando para o sexo feminino, a administração de estrogênios resultará no “desenvolvimento de seios e aparência corporal feminina”. A administração de hormônios do sexo oposto para tais pacientes ocorrerá para o resto de suas vidas. [83]

A cirurgia é prescrita para pacientes uma vez que chegam aos 18 anos de idade, embora “se o paciente não está satisfeito com, ou está ambivalente a respeito de, os efeitos hormonais ou cirúrgicos, o paciente não é encaminhado para cirurgia”. [84] A cirurgia de transição de homem para mulher envolve a construção de “genitais externas aparentemente femininas” (o que envolve a remoção dos testículos), em adição ao aumento dos seios se a terapia com estrogênios não resultou no aumento satisfatório dos seios. [85] Para mulheres transicionando para o sexo masculino, a primeira cirurgia é geralmente a mastectomia; algumas pacientes transicionando preferem não se submeter à faloplastia (a construção cirúrgica de um pênis), uma vez que a qualidade e a funcionalidade de tal “neopênis” cirurgicamente construídos varia. [86] A remoção do útero e dos ovários também são procedimentos cirúrgicos comuns para essas pessoas. [87] Após a remoção cirúrgica das gônadas (testículos ou ovários), os pacientes descontinuam o tratamento com análogos de GnRH, uma vez que o eixo de sinalização do GnRH para a hipófise não vai mais resultar na produção de hormônios sexuais quando as glândulas são removidas. [88] Algumas das operações cirúrgicas envolvidas na redesignação sexual, como o aumento dos seios, são primariamente cosméticas; outras, como a remoção das gônadas, têm efeitos biológicos significativos no sentido de que eles debilitam ou eliminam da pessoa as capacidades reprodutivas naturais e as habilidades de produzir hormônios sexuais importantes. Entretanto, nenhuma das cirurgias ou tratamentos hormonais atualmente possíveis confere as capacidades reprodutivas do sexo oposto.

De acordo com pesquisadores na clínica holandesa, alguns dos efeitos conhecidos da supressão da puberdade em crianças fisiologicamente normais são os que se esperaria de alterações feitas nesse estágio crítico do desenvolvimento humano. Tem um efeito negativo significativo nas taxas de crescimento em altura tanto em mulheres transicionando para o sexo masculino quanto em homens transicionando para o sexo feminino. [89] No primeiro caso, as pacientes vivenciaram um estirão de crescimento quando andrógenos foram administrados, enquanto que, no segundo caso, o tratamento com estrógeno “pode resultar em uma altura final feminina mais apropriada” [90]. O desenvolvimento da densidade mineral óssea normal é outra preocupação para crianças e adolescentes tratados com hormônios bloqueadores de puberdade. Relatórios iniciais sugeriram que os pacientes podem ter experimentado o desenvolvimento reduzido de sua densidade mineral óssea enquanto tratadas com bloqueadores de puberdade, apesar de essa densidade aumentar quando o tratamento com hormônios do outro sexo começavam. [91] Outros relatórios mais recentes são confusos; um artigo descobriu que, apesar de a massa óssea não diminuir durante a supressão da puberdade, as crianças submetidas à supressão da puberdade estavam abaixo das taxas regulares de aumento da densidade óssea para sua idade, [92] enquanto que outro sugeriu que a supressão da puberdade resultada em crescimento ósseo diminuído em adolescentes com disforia de gênero. [93]

Nos Estados Unidos, o tratamento para disforia de gênero com drogas de análogos de GnRH ainda não foi aprovado pelo FDA (apesar de tratamentos para a puberdade precoce, câncer de próstata e outras condições serem aprovadas). [94] Isso significa que a supressão da puberdade depende de prescrição “off-label”* de tratamentos análogos de GnRH; é permitido aos médicos que usem tais drogas no tratamento de crianças com disforia de gênero, mas a ausência de aprovação da FDA significa que companhias farmacêuticas vendendo tais drogas não podem propagandeá-las para o tratamento de disforia de gênero. Esse status off-label* reflete que a segurança e a eficácia de seu uso ainda não foi comprovada em procedimentos clínicos.

* O uso “off-label” de uma medicação significa seu uso fora das normas da FDA — o uso de uma droga para tratamentos não listados ou não aprovados pela agência.

Justificativas fracas

Modificar o desenvolvimento biologicamente normal de crianças de 12 anos para tratar uma condição psiquiátrica é um passo sério, um que os cientistas que desenvolveram o protocolo holandês tentam justificar com uma série de argumentos. Primeiramente, argumentam que o bloqueio da puberdade pode mitigar as dificuldades psicossociais vivenciadas por adolescentes com disforia de gênero por meio da diminuição da crescente incompatibilidade entre o a identidade de gênero e o sexo do paciente. [95] Também argumentam que mitigar o desenvolvimento inicial de características sexuais secundárias durante a puberdade pode facilitar a eventual transição (tanto médica quanto social) para viver como o sexo oposto. [96]

Para pacientes e médicos comprometidos com a visão de que a disforia de gênero de uma pessoa jovem representa um problema real e persistente que pode ser resolvido melhor pela transição do paciente para viver como o sexo oposto, a supressão da puberdade pode parecer uma abordagem desejável. Mas a maioria das crianças que se identificam como o sexo oposto não persistirão nesses sentimentos e eventualmente se identificarão com se usexo biológico: de acordo com o Manual diagnóstico e estatístico de doenças mentais (Diagnostic and statistical manual of mental disorders”, “em homens biológicos, a persistência [da disforia de gênero] variou de 2.2% para 30%. Em mulheres biológicas, a persistência variou de 12% para 50%.” [97] (Como dito antes, há alguma evidência de que a identificação com o gênero oposto se torna mais persistente se entrar na adolescência. [98]). Os relativamente baixo níveis de persistência denotam um desafio para aqueles que usariam tratamentos de supressão de puberdade para crianças jovens — e para aqueles que recomendam que se encoraje e afirme o gênero com que a criança se identifica. A taxa de persistência epidemiologicamente baixa sugere que a supressão da puberdade não seria razoável para todas as crianças que vivenciam a disforia de gênero, uma vez que poderia ser um tratamento desnecessário para aquelas crianças cuja disforia não persistiria se não recebesse intervenção, e é geralmente considerado melhor, na prática clínica, evitar intervenções médicas desnecessárias. E, além de desnecessárias, essas intervenções, em alguns casos, poderiam ser danosas se levarem crianças cuja disforia de gênero seria resolvida a adolescência a, pelo contrário, persistirem na condição disfórica.

Em um artigo de 2008, os cientistas holandeses responderam a essa preocupação — a possibilidade de jovens adolescentes se submeterem a intervenções médicas que poderiam ser desnecessárias ou pior — argumentando que adolescentes que continuam a se identificar com o sexo oposto e que continuam a desejar a redesignação sexual no começo da puberdade raramente chegam a se identificar como seu sexo biológico; também apontam que nenhum de seus pacientes que foi considerado apto à redesignação de sexo decidiu contra isso. [99] Mas o fato de que nenhum dos pacientes para quem se recomendou a redesignação sexual decidiu contra o procedimento pode indicar ou que suas recomendações eram baseadas em um diagnóstico sólido de disforia de gênero persistente, ou que seus diagnósticos — juntamente com o curso do tratamento que o seguiu, incluindo a psicoterapia afirmativa de gênero e a supressão da puberdade — podem ter solidificado os sentimentos de identificação com o gênero oposto nesses pacientes, levando-os a se comprometer mais firmemente à redesignação sexual que eles de fato teriam se tivessem recebido diferentes diagnósticos ou tratamentos.

Os critérios utilizados pelos holandeses para garantir que medicamentos bloqueadores de puberdade são usados em casos apropriados pouco faz para suavizar a preocupação de que tais tratamentos possam tornar persistentes os sentimentos de identificação com o gênero oposto:

i) a presença de disforia de gênero desde a tenra infância; (ii) o aumento da disforia de gênero após as mudanças puberais; (iii) a ausência de comorbidades psiquiátricas que interfiram com a elaboração do diagnóstico ou com o tratamento; (iv) suportes social e psicológico adequados durante o tratamento; e (v) demonstração de conhecimento e compreensão dos efeitos do GnRH, dos tratamentos com hormônios do sexo oposto, da cirurgia, e das consequências sociais da redesignação de sexo. [100]

Vale a pena examinar de perto alguns desses critérios. O primeiro critério, de que a disforia de gênero é presente desde a tenra infância, parece presumir que a identificação do paciente com o outro gênero vai persistir se o paciente se sente assim há muito tempo. Mas sinais da disforia de gênero em crianças são ainda mais vagos e incertos do que sinais da disforia de gênero em adolescentes e pessoas adultas; diagnósticos de disforia de gênero em crianças se baseiam mais em comportamentos atípicos do gênero (por exemplo, meninos brincando de bonecas ou meninas preferindo brincar com meninos) do que em uma crença comprometida da parte dos pacientes de que eles realmente sejam do sexo oposto. Enquanto que a crescente severidade da persistência a longo prazo da disforia nos entornos da puberdade (segundo critério) pode ser associada com a persistência a longo termo da disforia de gênero, é difícil separar isso da possibilidade de que o “apoio psicológico e social” para os sentimentos, comportamentos e identificação de e com o “outro gênero” da criança (o quarto critério) pode ter contribuído para a persistência da disforia de gênero da criança. E a respeito do quinto e último critério, parece difícil esperar que uma pessoa de 12 anos tenha entendimento dos efeitos dessas intervenções médicas complexas e das “consequências sociais da redesignação sexual” quando essas são matérias que são pobremente entendidas mesmo por médicos e cientistas. Além disso, se tão jovens quanto 12 anos completamente entendem sua identidade de gênero e se podem ser diagnosticadas de forma confiável de terem disforia de gênero persistente são questões psicológicas difíceis que não podem ser separadas de julgamentos médicos sobre a adequação da supressão da puberdade.

No mesmo artigo de 2008, os autores escrevem que prover a supressão da puberdade permite que pacientes evitem a “experiência alienante de desenvolver características sexuais que eles não tomam como suas” e “também é prova da solidariedade do profissional de saúde com o pleito do pretendente” [101]. Apesar de ser importante que os médicos estabeleçam uma relação de confiança e de compaixão com seus pacientes, o oferecimento da “prova de solidariedade” aos pacientes por meio da adesão a seus desejos, independentemente de esses desejos serem de seu melhor interesse médico ou não, está muito longe da tradição de Hipócrates e aliena a responsabilidade do médico de tratar pacientes com seu melhor benefício em mente.

Um grande atrativo para a supressão da puberdade é a alegação de que o procedimento é “totalmente reversível”. [102] Essa afirmação permite que os defensores façam a supressão da puberdade parecer como um comprometimento prudente entre dois extremos: não fornecer nenhum tratamento médico para jovens pacientes diagnosticados com disforia de gênero, o que pareceria negligente, e imediata e permanentemente alterar medicamente as características da criança, o que pareceria inconsequente.

Algumas alegações de reversibilidade:

  • Os cientistas holandeses que desenvolveram o protocolo para a supressão da puberdade a descrevem como “completamente reversível”. [103]
  • O endocrinologista pediátrico Daniel Metzger diz que “o efeito de drogas bloqueadoras de puberdade é reversível”. [104]
  • Norman Spack, um médico no Hospital Infantil de Boston que trata de disforia de gênero, descreve as drogas de supressão da puberdade como “totalmente reversíveis”. [105]
  • Em uma revisão das pesquisas em drogas bloqueadoras de puberdade para um grupo de defensores da causa LGBT, Laura E. Kuper, uma pesquisadora focada na saúde de transgêneros, descreve o bloqueio da puberdade como “totalmente reversível”. [107]
  • Jornalista transgênero Mitch Kellaway, escrevendo para o site Advocate.com sobre como “bloquear a puberdade é benéfico para a juventude transgênera”, descreve o bloqueio da puberdade como “totalmente reversível”. [107]
  • Em outra história no site Advocate.com sobre o bloqueio da puberdade, a ativista transgênero Andrea James escreve que “o tratamento é reversível”. [108]
  • Bioetologista Arthur Caplan descreveu o bloqueio da puberdade como reversível, dizendo que “caso se decida parar o tratamento, a puberdade voltará”. [109]
  • Endocrinologistas pediátricos Christopher P. Houk e Peter A. Lee escrevem que a supressão da puberdade em crianças com disforia de gênero é “reversível”. [110]

Uma virada no tema da reversibilidade aparece no guia para apoiar e se importar por crianças transgênero publicado em 2016 pela Campanha pelos Direitos Humanos (Human Rights Campaign). O documento frisa o quanto o desenvolvimento de características sexuais secundárias pode ser “extremamente desconfortável” para a juventude transgênero, e inclusive pontua que “algumas dessas mudanças físicas, como o desenvolvimento de seios, são irreversíveis ou requereriam cirurgia para serem desfeitas” (grifo nosso). [111] Linguagem similar é usada por cientistas que desenvolveram o protocolo holandês, que escrevem que “à criança que viverá permanentemente no papel de gênero desejado como adulta pode ser poupado o tormento do desenvolvimento púbere (completo) das características sexuais secundárias ‘erradas’” [112] e em outro momento escrevem que a supressão da puberdade é importante porque o desenvolvimento de características sexuais secundárias que fazem uma pessoa transgênero parecer “como um homem (mulher) enquanto vivem como uma mulher (homem) […] é obviamente uma desvantagem imensa e permanente”. [113] Isso desvirtua a noção de “reversibilidade”, tratando o processo natural de desenvolvimento biológico como uma série de problemas irreversíveis que a medicina deveria buscar prevenir, enquanto apresentando a intervenção — a supressão da puberdade — como benigna e reversível.

Um argumento comum baseado na ideia de que a supressão da puberdade é um primeiro passo prudente e reversível é que, como os cientistas holandeses assim colocam, ela pode “dar aos adolescentes, juntamente com o médico que lhe acompanha, mais tempo para explorar sua identidade de gênero, sem a angústia de desenvolver características sexuais secundárias. A precisão do diagnóstico, então, pode ser otimizada.” [114] Há muita estranheza nesse argumento. Ele presume que as características sexuais naturais interferem no “entendimento” da identidade de gênero, quando, na verdade, seria esperado que o desenvolvimento das características sexuais naturais poderia contribuir com a consolidação natural da característica de gênero da pessoa. Também presume que interferir no desenvolvimento das características sexuais naturais possibilita um diagnóstico mais preciso da identidade de gênero da criança. Mas parece igualmente plausível que a interferência no desenvolvimento puberal normal influenciará a identidade de gênero da criança por meio da redução da perspectiva de desenvolver uma identidade de gênero correspondente a seu sexo biológico.

Dada sua potencial importância nas vidas das crianças afetadas, vale a pena examinar com cuidado essas alegações de reversibilidade. Em biologia desenvolvimental, faz pouco sentido descrever algo como “reversível”. Se uma criança não desenvolve certas características aos 12 anos por conta de uma intervenção médica, então vir a desenvolvê-las aos 18 anos não é uma “reversão”, uma vez que a sequência do desenvolvimento já foi quebrada. Isso é especialmente importante porque há uma relação complexa entre os desenvolvimentos psicossocial e fisiológico durante a adolescência. A identidade de gênero é moldada durante a puberdade e a adolescência na medida em que os corpos das pessoas se tornam mais sexualmente diferenciados e maduros. Considerando o pouco que conhecemos sobre identidade de gênero e como é formada e consolidada, deveríamos ser cautelosos na interferência do processo normal de maturação sexual.

Ao invés de alegar que a supressão da puberdade é reversível, pesquisadores e clínicos deveriam focar na questão de se os desenvolvimentos fisiológico e psicossocial que ocorrem durante a puberdade podem retomar seu caminho normal após tratamentos de supressão da puberdade serem interrompidos. Em crianças com puberdade precoce, esse parece ser o caso, de fato. Hormônios de supressão da puberdade são tipicamente retirados na idade padrão do início da gonadarca, em torno dos 12 nos, e os níveis hormonais e o desenvolvimento puberal normais aos poucos são retomados. Em um método como de tratar a puberdade precoce, as meninas alcançaram a menarca aproximadamente um ano após seu tratamento hormonal acabar, em uma idade média de aproximadamente 13 anos, essencialmente a mesma idade média da população em geral. [115]

Entretanto, as evidências de segurança e de eficácia da supressão da puberdade em meninos é menos robusta, principalmente porque a puberdade precoce é muito mais rara em meninos. Apesar de os riscos serem especulativos e baseados em evidências limitadas, meninos que se submetem à supressão da puberdade podem ter maior risco de desenvolver microcalcificações testiculares, que podem estar associadas a um risco aumentando de câncer testicular, e a supressão da puberdade em meninos também pode estar associada à obesidade. [116]

Mais crítico ainda, diferentemente de crianças afetadas pela puberdade precoce, adolescentes com disforia de gênero não possuem nenhuma desordem puberal fisiológica que está sendo corrigida pelas drogas supressoras da puberdade. O fato de que crianças com a puberdade precoce suprimida entre 8 e 12 anos retomam a puberdade aos 13 anos não significa que o desenvolvimento puberal normal de adolescentes que sofrem de disforia de gênero (cuja puberdade começa a ser suprimida aos 12 anos) vai ser retomado normalmente se eles decidirem parar com o tratamento e não se submeter a outros procedimentos de redesignação sexual. Outra questão complicada que tem sido largamente negligenciada são as consequências psicológicas que podem acometer as crianças com disforia de gênero cuja puberdade foi suprimida e que depois se identificam com seu sexo biológico.

Apesar de haver pouca evidência científica acerca dos efeitos da supressão da puberdade em crianças com disforia de gênero — e certamente não têm havido ensaios clínicos controlados comparando os resultados da supressão da liberdade aos resultados de abordagens terapêuticas alternativas — há razões para suspeitar que os tratamentos podem ter consequências negativas para o desenvolvimento neurológico. Cientistas da Universidade de Glasgow recentemente usaram tratamentos de supressão da puberdade em ovelhas, e descobriram que a memória espacial de ovelhas macho foi prejudicada pela supressão da puberdade utilizando análogos de GnRH, [117] e que ovelhas adultas que foram tratadas com análogos de GnRH na puberdade continuaram a mostrar sinais de memória espacial prejudicada. [118] Em um estudo de 2015 sobre adolescentes tratados com a supressão de puberdade, os autores alegaram que “não há efeitos danosos de [análogos de GnRH] em [funções cognitivas]”, [119] mas os resultados de seu estudo foram mais ambíguos e mais sugestivos de danos do que o resumo indica. [120] (Também vale a pena notar que o estudo foi conduzido em um número reduzido de indivíduos, o que dificulta a detecção de diferenças significativas.)

Em adição às razões para suspeitar que a supressão da puberdade pode ter efeitos colaterais nos desenvolvimentos fisiológico e psicológico, a evidência de que algo como a puberdade normal será retomada nesses pacientes após a interrupção do tratamento de supressão da puberdade é muito fraca. Isso acontece porque virtualmente não há relatórios publicados, ou mesmo estudos de caso, de adolescentes interrompendo o uso de drogas supressoras da puberdade e retomando o desenvolvimento puberal normal típico de seu sexo. Ao invés de retomar a puberdade biologicamente normal, esses adolescentes geralmente vão da puberdade suprimida para a puberdade medicamente condicionada com hormônios do sexo oposto, quando recebem tais hormônios na idade de 16 anos, aproximadamente. Durante esse processo, de acordo com o protocolo holandês, a supressão da puberdade com análogos de GnRH continua a ser administrada para prevenir o início da gonadarca; os hormônios sexuais que são normalmente secretados pelas gônadas em amadurecimento não são produzidas, e médicos administram hormônios sexuais normalmente produzidos pelas gônadas do sexo oposto. Isso significa que adolescentes submetidos ao tratamento hormonal com hormônios do sexo oposto contornam a forma mais fundamental de maturação sexual — a maturação de seus órgãos reprodutivos. Pacientes submetidos à redesignação sexual descontinuam o tratamento de GnRH após terem suas gônadas removidas, uma vez que a secreção de hormônios sexuais que o tratamento busca evitar não será mais possível.

A tecnologia médica de hoje não torna possível que o paciente crie órgãos sexuais do sexo oposto. Ao invés disso, médicos focam na prevenção da maturação das características sexuais primárias e na manipulação das características sexuais secundárias por meio da administração de hormônios. A infertilidade é, portanto, um dos maiores efeitos colaterais do tratamento que vai desde a supressão da puberdade, passando pelo uso de hormônios do sexo oposto, até a redesignação sexual cirúrgica.

Após a remoção cirúrgica dos ovários e dos testículos, que o protocolo holandês recomenda para jovens adultos como disforia de gênero em torno dos 18 anos, a possibilidade de desenvolvimento puberal normal torna-se impossível, uma vez que são esses órgãos que normalmente produzem os andrógenos e estrógenos responsáveis pelo desenvolvimento das características sexuais secundárias. Apesar de a secreção de GnRH pelo hipotálamo continuar a estimular a hipófise a secretar gonadotrofinas, se as próprias gônadas são fisicamente removidas do corpo, esses sinais hormonais se tornam, virtualmente, “letra morta”.

Já que os maiores estudos da supressão da puberdade não reportaram resultados de pacientes que descontinuaram o tratamento e então retomaram a puberdade típica de seu sexo, nós também não sabemos o quão normalmente as características sexuais primárias e secundárias se desenvolverão em adolescentes cuja puberdade foi artificialmente suprimida aos 12 anos. Então, as alegações de que a supressão da puberdade para adolescentes com disforia de gênero é “reversível” é baseada em especulação, não análise rigorosa de dados científicos.

Essa falta de dados sobre pacientes com disforia de gênero que descontinuaram o tratamento e retomaram o desenvolvimento normal levanta novamente a importante questão de se esses tratamentos contribuem para a persistência da disforia de gênero em pacientes que poderiam, de outra forma, ter esclarecido seus sentimentos de serem do sexo oposto. Como notado acima, a maioria das crianças que são diagnosticadas com disforia de gênero eventualmente vão parar de se identificar como o sexo oposto. O fato de que a identificação com o gêneo oposto aparentemente persiste para, virtualmente, todas as pessoas que se submetem à supressão da puberdade pode indicar que esses tratamentos aumentam a probabilidade de persistir a identificação desses pacientes com o gênero oposto.

Como o filósofo Ian Hacking argumentou uma vez, muitas condições psicológicas são fruto do que ele chama de “efeito looping”, em que a classificação de pessoas como pertencentes a certos “classes” pode mudar o que essas pessoas pensam de si e como se comportam. [121] Crianças e adolescentes que experimentam confusão sobre papéis de gênero, sobre sua sexualidade e seu comportamento e sobre as mudanças causadas pela puberdade têm especialmente grande probabilidade de assumir o modo de vida provido por uma “classe” como a “transgênero” como uma forma de encontrar sentido em seu contexto confuso, especialmente quando estão sujeitos à pressão de serem assim rotulados por adultos em posição de autoridade, incluindo pais e mães, professores, psicólogos e médicos.

O uso de bloqueadores de puberdade e hormônios do sexo oposto para crianças é um passo radical que presume grande quantidade de conhecimento e capacidade por parte das crianças concordando com esses procedimentos, por parte dos pais ou guardiões legais aos quais se requer que consintam legalmente que a criança o faça, e por parte dos cientistas e médicos que estão desenvolvendo e administrando esses procedimentos. Frequentemente ouvimos de neurocientistas que o cérebro adolescente é imaturo demais para fazer decisões racionais confiáveis, [122] mas é esperado de nós que adolescentes conturbados emocionalmente tomem decisões sobre sua identidade de gênero e sobre tratamentos médicos sérios com 12 anos ou menos. E é esperado de nós que aguardemos pais e médicos avaliarem os riscos e benefícios da supressão da puberdade, apesar do estado de ignorância na comunidade científica sobre a natureza da identidade de gênero.

A alegação de que tratamentos de bloqueio da puberdade são completamente reversíveis os faz parecerem menos drásticos, mas essa alegação não tem suporte científico. Continua um mistério se a puberdade típica do sexo e ordinária continuará após a supressão da puberdade em pacientes com disforia de gênero. Também não é claro se crianças serão capazes de desenvolver funções reprodutivas normais se elas descontinuassem a supressão da puberdade. Da mesma forma, continua incerto se o desenvolvimento de músculos e de ossos ocorrerá normalmente para essas crianças se elas retomarem a puberdade típica de seu sexo. Além disso, não entendemos completamente as consequências psicológicas de usar a supressão de puberdade para tratar pessoas jovens com disforia de gênero.

Mais pesquisa é necessária para resolver essas questões ainda não respondidas. Ao mesmo tempo, as pesquisas sobre como e por que a disforia de gênero ocorre, persiste e acaba também devem continuar, pois podem elucidar novas formas de ajudar as pessoas a lidarem com a disforia de gênero com tratamentos menos permanentes e drásticos do que a redesignação de sexo.

À luz das várias incertezas e desconhecimentos, seria apropriado descrever o uso de tratamentos bloqueadores de puberdade para disforia de gênero como experimentais. Ainda assim, esse tratamento não está sendo considerado como tal pela comunidade médica. No curso de décadas a medicina experimental desenvolveu muitas normas, padrões e protocolos, incluindo a proteção à pessoa humana, o uso de revisões institucionais, e experimentos clínicos cuidadosamente controlados, assim como estudos de acompanhamento a longo prazo. Essas práticas duradouras objetivam tornar a medicina experimental mais rigorosa e servir o interesse de pacientes, de médicos e da comunidade. Mas quando o assunto é o tratamento por supressores de puberdade para a disforia de gênero, esses protocolos e padrões parecem estar quase completamente ausentes — um fato que desagrada pacientes, médicos, a comunidade e a busca pela verdade. Médicos deveriam ser cautelosos quanto ao adote de terapias experimentais em geral, mas especialmente quanto àquelas que visam crianças; e deveriam, particularmente, evitar qualquer terapia experimental que virtualmente não tem nenhuma evidência científica de segurança ou efetividade. Independentemente das boas intenções dos médicos e dos pais, expor pessoas jovens a esse tipo de tratamento é expô-las ao perigo.

Se por um lado não se sabe muito e com certeza a respeito da disforia de gênero, por outro lado há claras evidências de que pacientes que se identificam com o sexo oposto geralmente sofrem muito: possuem maiores taxas de ansiedade, de depressão, e até de suicídio do que a população em geral. Algo deve ser feito para ajudar tais pacientes, mas enquanto cientistas lutam para entender melhor o que é disforia de gênero e o que a causa, não parece prudente adotar tratamentos hormonais e redesignação de sexo como as principais ferramentas terapêuticas para tratar tal condição.


Notas

[*] The most familiar colloquial term used to describe the medical interventions that transform the appearance of transgender individuals may be “sex change” (or, in the case of surgery, “sex-change operation”), but this is not commonly used in the scientific and medical literature today. While no simple terms for these procedures are completely satisfactory — in the context of this article the most accurate description would be “hormonal and surgical interventions to modify secondary sex characteristics” — we employ the commonly used terms sex reassignment and sex-reassignment surgery or procedures, except when quoting a source that uses “gender reassignment” or some other term.

[1] 1. Lawrence S. Mayer and Paul R. McHugh, “Part Two: Sexuality, Mental Health Outcomes, and Social Stress,” in Sexuality and Gender: Findings from the Biological, Psychological, and Social Sciences, The New Atlantis 50 (Fall 2016): 73–75, http://www.thenewatlantis.com/publications/part-two-sexuality-mental-health-outcomes-and-social-stress-sexuality-and-gender.

[2] American Psychiatric Association, “Gender Dysphoria,” Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition [hereafter DSM-5] (Arlington, Va.: American Psychiatric Publishing, 2013), 452, http://dx.doi.org/10.1176/appi.books.9780890425596.dsm14.

[3] Estimates for the prevalence of intersex conditions vary widely; reputable studies indicate that true genital ambiguity occurs in roughly 1 in 5,000 births, while others claim that as many as 1 in 300 children are intersex in some sense. Amy C. Rothkopf and Rita Marie John, “Understanding Disorders of Sexual Development,” Journal of Pediatric Nursing 29, no. 5 (2014): e23–e34, http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2014.04.002.

[4] For an overview of this subject, see Lawrence S. Mayer and Paul R. McHugh, “Part Three: Gender Identity,” in Sexuality and Gender, The New Atlantis 50 (Fall 2016): 86–143, http://www.thenewatlantis.com/publications/part-three-gender-identity-sexuality-and-gender.

[5] Maureen D. Connolly et al., “The Mental Health of Transgender Youth: Advances in Understanding,” Journal of Adolescent Health 59, no. 5 (2016), 489–495, http://dx.doi.org/10.1016/j.jadohealth.2016.06.012.

[6] American Psychiatric Association, “Gender Dysphoria,” DSM-5, 455.

[7] Bernadette Wren, “Early Physical Intervention for Young People with Atypical Gender Identity Development,” Clinical Child Psychology and Psychiatry 5, no. 2 (2000): 222–223, http://dx.doi.org/10.1177/1359104500005002007; Thomas D. Steensma et al., “Desisting and persisting gender dysphoria after childhood: a qualitative follow-up study,” Clinical Child Psychology and Psychiatry 16, no. 4 (2011): 499–516, http://dx.doi.org/10.1177/1359104510378303.

[8] See, for example, Darryl B. Hill et al., “An Affirmative Intervention for Families With Gender Variant Children: Parental Ratings of Child Mental Health and Gender,” Journal of Sex & Marital Therapy 36, no. 1 (2010): 12, http://dx.doi.org/10.1080/00926230903375560. See also such press accounts as Petula Dvorak, “Transgender at five,” Washington Post, May 19, 2012, http://www.washingtonpost.com/local/transgender-at-five/2012/05/19/gIQABfFkbU_story.html.

[9] See, for example, Peggy T. Cohen-Kettenis and Stephanie van Goozen, “Pubertal delay as an aid in diagnosis and treatment of a transsexual adolescent,” European Child and Adolescent Psychiatry 7, no. 4 (1998): 246, http://dx.doi.org/10.1007/s007870050073.

[10] Sam Hsieh and Jennifer Leininger, “Resource List: Clinical Care Programs for Gender-Nonconforming Children and Adolescents,” Pediatric Annals 43, no. 6 (2014): 238–244, http://dx.doi.org/10.3928/00904481-20140522-11.

[11] “GIDS referrals figures for 2016/17,” Gender Identity Development Service, GIDS.NHS.uk (undated), http://gids.nhs.uk/sites/default/files/content_uploads/referral-figures-2016-17.pdf.

[12] Ibid.

[13] Hayley Wood et al., “Patterns of Referral to a Gender Identity Service for Children and Adolescents (1976–2011): Age, Sex Ratio, and Sexual Orientation,” Journal of Marital and Family Therapy 39 (2013): 2, http://dx.doi.org/10.1080/0092623X.2012.675022.

[14] Ibid.

[15] Norman P. Spack et al., “Children and Adolescents With Gender Identity Disorder Referred to a Pediatric Medical Center,” Pediatrics 129, no. 3 (2012): 420, http://dx.doi.org/10.1542/peds.2011-0907.

[16] Melinda Chen, John Fuqua, and Erica A. Eugster, “Characteristics of Referrals for Gender Dysphoria Over a 13-Year Period,” Journal of Adolescent Health 58, no. 3 (2016): 369, http://dx.doi.org/10.1016/j.jadohealth.2015.11.010.

[17] Ibid., 370.

[18] Kay Bussey, “Gender Identity Development,” in Handbook of Identity Theory and Research, eds. Seth J. Schwartz, Koen Luyckx, and Vivian L. Vignoles (New York: Springer, 2011): 608, http://dx.doi.org/10.1007/978-1-4419-7988-9_25.

[19] Arthur C. Guyton and John E. Hall, Textbook of Medical Physiology, Eleventh Edition (Philadelphia, Penn.: Elsevier, 2005), 1008.

[20] William A. Marshall and James M. Tanner, “Puberty,” in Human Growth: A Comprehensive Treatise, Second Edition, Volume 2, eds. Frank Falkner and James M. Tanner (New York: Springer, 1986), 171.

[21] Ibid., 171–172.

[22] Robert V. Kail and John C. Cavanaugh, Human Development: A Life-Span View, Seventh Edition (Boston, Mass.: Cengage Learning, 2016), 276.

[23] Jamie Stang and Mary Story, “Adolescent Growth and Development,” in Guidelines for Adolescent Nutrition Services, eds. Jamie Stang and Mary Story (Minneapolis, Minn.: University of Minnesota, 2005), 4.

[24] Ibid., 3.

[25] Marshall and Tanner, “Puberty,” 191–192.

[26] Ibid., 185.

[27] Margaret E. Wierman and William F. Crowley, Jr., “Neuroendocrine Control of the Onset of Puberty,” in Human Growth, Volume 2, 225.

[28] Sharon E. Oberfield, Aviva B. Sopher, and Adrienne T. Gerken, “Approach to the Girl with Early Onset of Pubic Hair,” Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 96, no. 6 (2011): 1610–1622, http://dx.doi.org/10.1210/jc.2011-0225.

[29] Selma Feldman Witchel and Tony M. Plant, “Puberty: Gonadarche and Adrenarche,” in Yen and Jaffe’s Reproductive Endocrinology, Sixth Edition, eds. Jerome F. Strauss III and Robert L. Barbieri (Philadelphia, Penn.: Elsevier, 2009), 395.

[30] Allan E. Herbison, “Control of puberty onset and fertility by gonadotropin-releasing hormone neurons,” Nature Reviews Endocrinology12 (2016): 452, http://dx.doi.org/10.1038/nrendo.2016.70.

[31] Ibid., 453.

[32] Ibid., 454.

[33] Ibid., 452.

[34] Michael A. Preece, “Prepubertal and Pubertal Endocrinology,” in Human Growth: A Comprehensive Treatise, Volume 2, 212.

[35] Rex A. Hess, “Estrogen in the adult male reproductive tract: A review,” Reproductive Biology and Endocrinology 1, (2003), https://dx.doi.org/10.1186/1477-7827-1-52; Henry G. Burger, “Androgen production in women,” Fertility and Sterility 77 (2002): 3–5, http://dx.doi.org/10.1016/S0015-0282(02)02985-0.

[36] Russell D. Romeo, “Neuroendocrine and Behavioral Development during Puberty: A Tale of Two Axes,” Vitamins and Hormones 71 (2005): 1–25, http://dx.doi.org/10.1016/S0083-6729(05)71001-3.

[37] Wierman and Crowley, “Neuroendocrine Control of the Onset of Puberty,” 225.

[38] Preece, “Prepubertal and Pubertal Endocrinology,” 218–219.

[39] Udo J. Meinhardt and Ken K. Y. Ho, “Modulation of growth hormone action by sex steroids,” Clinical Endocrinology65, no. 4 (2006): 414, http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2265.2006.02676.x.

[40] Ibid.

[41] For one recent review of the science of neurological sex differences, see Amber N. V. Ruigrok et al., “A meta-analysis of sex differences in human brain structure,” Neuroscience Biobehavioral Review39 (2014): 34–50, http://dx.doi.org/10.1016/j.neubiorev.2013.12.004.

[42] For an overview of the distinction between the organizational and activating effects of hormones and its importance for sexual differentiation, see Arthur P. Arnold, “The organizational-activational hypothesis as the foundation for a unified theory of sexual differentiation of all mammalian tissues,” Hormones and Behavior 55, no. 5 (2009): 570–578, http://dx.doi.org/10.1016/j.yhbeh.2009.03.011.

[43] Lawrence S. Mayer and Paul R. McHugh, “Part Two: Sexuality, Mental Health Outcomes, and Social Stress,” in Sexuality and GenderThe New Atlantis 50 (Fall 2016): 102.

[44] Sarah-Jayne Blakemore, Stephanie Burnett, and Ronald E. Dahl, “The Role of Puberty in the Developing Adolescent Brain,” Human Brain Mapping 31 (2010): 926, http://dx.doi.org/10.1002/hbm.21052.

[45] Ibid., 927.

[46] Karen Oerter Klein, “Precocious Puberty: Who Has It? Who Should Be Treated?,” Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 84, no. 2 (1999): 411, http://doi.org/10.1210/jcem.84.2.5533. See also: Frank M. Biro et al., “Onset of Breast Development in a Longitudinal Cohort,” Pediatrics 132, no. 6 (2013): 1019–1027, http://dx.doi.org/10.1542/peds.2012-3773; Carl-Joachim Partsch and Wolfgang G. Sippell, “Pathogenesis and epidemiology of precocious puberty. Effects of exogenous oestrogens,” Human Reproduction Update 7, no. 3 (2001): 293, http://dx.doi.org/10.1111/j.1600-0463.2001.tb05760.x.

[47] Anne-Simone Parent et al., “The Timing of Normal Puberty and the Age Limits of Sexual Precocity: Variations around the World, Secular Trends, and Changes after Migration,” Endocrine Reviews 24, no. 5 (2011): 675, http://dx.doi.org/10.1210/er.2002-0019.

[48] Jean-Claude Carel et al., “Precocious puberty and statural growth,” Human Reproduction Update 10, no. 2 (2004): 135, http://dx.doi.org/10.1093/humupd/dmh012.

[49] Partsch and Sippell, “Pathogenesis and epidemiology of precocious puberty,” 294–295.

[50] Ibid.

[51] Leandro Soriano-Guillén et al., “Central Precocious Puberty in Children Living in Spain: Incidence, Prevalence, and Influence of Adoption and Immigration,” Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 95, no. 9 (2011): 4307, http://dx.doi.org/10.1210/jc.2010-1025. In some cases, peripheral precocious puberty is caused by an underlying condition, such as a tumor, that can be treated.

[52] Grete Teilmann et al., “Prevalence and Incidence of Precocious Pubertal Development in Denmark: An Epidemiologic Study Based on National Registries,” Pedriatics 116, no. 6 (2005): 1323, http://dx.doi.org/10.1542/peds.2005-0012.

[53] William F. Crowley, Jr. et al., “Therapeutic use of pituitary desensitization with a long-acting LHRH agonist: a potential new treatment for idiopathic precocious puberty,” Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 52, no. 2 (1981): 370–372, http://dx.doi.org/10.1210/jcem-52-2-370. (LHRH refers to “lutenizing hormone releasing hormone,” another term for GnRH.)

[54] Crowley et al., “Therapeutic use of pituitary desensitization with a long-acting LHRH agonist,” 370–372.

[55] Marisa M. Fisher, Deborah Lemay, and Erica A. Eugster, “Resumption of Puberty in Girls and Boys Following Removal of the Histrelin Implant,” The Journal of Pediatrics 164, no. 4 (2014): 3, http://dx.doi.org/10.1016/j.jpeds.2013.12.009.

[56] “Full Prescribing Information” for Lupron Depot-Ped, FDA.gov (undated), https://www.accessdata.fda.gov/drugsatfda_docs/label/2011/020263s036lbl.pdf.

[57] Jean-Claude Carel et al., “Consensus Statement on the Use of Gonadotropin-Releasing Hormone Analogs in Children,” Pediatrics 123, no. 4 (2009): e753, http://dx.doi.org/10.1542/peds.2008-1783.

[58] Ibid.

[59] Assunta Albanese and Neil W. Hopper, “Suppression of menstruation in adolescents with severe learning disabilities,” Archives of Disease in Childhood 92, no. 7 (2007): 629, https://dx.doi.org/10.1136/adc.2007.115709. (The use of GnRH analogues for children with severe learning disabilities is distinct from the approach to puberty blocking in the famous case of an American girl born in 1997 with severe brain impairment. Her family and doctors undertook a series of drastic measures, sometimes called the “Ashley Treatment”: in addition to administering estrogen to induce the kind of growth-limiting effect of early puberty that GnRH treatment is meant to prevent, her doctors also performed a hysterectomy and surgically prevented her breasts from growing. The Ashley Treatment aims at attenuating growth, whereas when GnRH analogues are used for patients with precocious puberty the aim is to maximize adult height. Daniel F. Gunther and Douglas S. Diekema, “Attenuating Growth in Children With Profound Developmental Disability: A New Approach to an Old Dilemma,” Archives of Pediatric and Adolescent Medicine 160, no. 10 [2006]: 1014, http://dx.doi.org/10.1001/archpedi.160.10.1013. See also PillowAngel.org, a website operated by the parents of the woman known as Ashley X.)

[60] Frans Erdkamp et al., “GnRH agonists and antagonists in prostate cancer,” Generics and Biosimilars Initiative Journal3, no. 3 (2014): 133, http://dx.doi.org/10.5639/gabij.2014.0303.031.

[61] Charalampos S. Siristatidis et al., “Gonadotrophin-releasing hormone agonist protocols for pituitary suppression in assisted reproduction,” Cochrane Database of Systematic Reviews 11 (2015), http://dx.doi.org/10.1002/14651858.CD006919.pub4.

[62] On the role of GnRH beyond puberty, see, for example, Naomi E. Rance, “Menopause and the human hypothalamus: Evidence for the role of kisspeptin/neurokinin B neurons in the regulation of estrogen negative feedback,” Peptides 30, no. 1 (2009): 111, http://dx.doi.org/10.1016/j.peptides.2008.05.016; Alvin M. Matsumoto, “Fundamental Aspects of Hypogonadism in the Aging Male,” Reviews in Urology 5, suppl. 1 (2003): S3, https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1502324/.

[63] Wylie C. Hembree et al., “Endocrine Treatment of Transsexual Persons: An Endocrine Society Clinical Practice Guideline,” The Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism 94, no. 9 (2009): 3133, http://dx.doi.org/10.1210/jc.2009-0345.

[64] Wylie C. Hembree, “Guidelines for Pubertal Suspension and Gender Reassignment for Transgender Adolescents,” Child and Adolescent Psychiatric Clinics of North America 20, no. 2 (2011): 725–732, http://dx.doi.org/10.1016/j.chc.2011.08.004. Note: At the time these guidelines were published, the Pediatric Endocrine Society was still operating under its former name, the Lawson Wilkins Pediatric Endocrine Society.

[65] Ibid, 725.

[66] Ibid.

[67] Ibid.

[68] World Professional Association for Transgender Health, “Standards of Care for the Health of Transsexual, Transgender, and Gender Nonconforming People,” Version 7 (2011): 19, http://www.wpath.org/site_page.cfm?pk_association_webpage_menu=1351&pk_association_webpage=4655.

[69] Hembree et al., “Endocrine Treatment of Transsexual Persons,” 3132–3154.

[70] Gabe Murchison et al., “Supporting and Caring for Transgender Children,” Human Rights Campaign (2016): 11, http://hrc-assets.s3-website-us-east-1.amazonaws.com/files/documents/SupportingCaringforTransChildren.pdf.

[71] Ibid.

[72] Lieke Josephina Jeanne Johanna Vrouenraets et al., “Early Medical Treatment of Children and Adolescents With Gender Dysphoria: An Empirical Ethical Study,” Journal of Adolescent Health 57, no. 4 (2015): 369, http://dx.doi.org/10.1016/j.jadohealth.2015.04.004.

[73] Ibid.

[74] George Tolis et al., “Suppression of androgen production by D-tryptophan-6-luteinizing hormone-releasing hormone in man,” Journal of Clinical Investigation 68, no. 3 (1981): 819–822, http://dx.doi.org/10.1172/JCI110320.

[75] Hembree et al., “Endocrine Treatment of Transsexual Persons,” 3144.

[76] Cohen-Kettenis and van Goozen, “Pubertal delay as an aid in diagnosis and treatment of a transsexual adolescent,” 246. See also Peggy T. Cohen-Kettenis, Thomas D. Steensma, and Annelou L.C. de Vries, “Treatment of Adolescents With Gender Dysphoria in the Netherlands,” Child Adolescent Psychiatric Clinics of North America 20, (2011): 689–700, http://dx.doi.org/10.1016/j.chc.2011.08.001.

[77] Henriette A. Delemarre-van de Waal and Peggy T. Cohen-Kettenis, “Clinical management of gender identity disorder in adolescents: a protocol on psychological and paediatric endocrinology aspects,” European Journal of Endocrinology155 (2006): S131–137, http://dx.doi.org/10.1530/eje.1.02231.

[78] Peggy T. Cohen-Kettenis, Henriette A. Delemarre-van de Waal, and Louis J.G. Gooren, “The Treatment of Adolescent Transsexuals: Changing Insights,” Journal of Sexual Medicine 5, no. 8 (2008): 1892–1897, http://dx.doi.org/10.1111/j.1743-6109.2008.00870.x.

[79] Delemarre-van de Waal and Cohen-Kettenis, “Clinical management of gender identity disorder in adolescents,” S132.

[80] Ibid., S135.

[81] Ibid., S133.

[82] Ibid.

[83] Ibid.

[84] Ibid., S134.

[85] Ibid.

[86] Ibid.

[87] Ibid.

[88] Ibid.

[89] Ibid., S135.

[90] Ibid., S136–S137.

[91] Ibid., S136.

[92] Denise Vink, Joost Rotteveel, and Daniel Klink, “Bone Mineral Density in Adolescents with Gender Dysphoria During Prolonged Gonadotropin Releasing Hormone Analog Treatment,” World Professional Association for Transgender Health(symposium presentation, 2016), http://wpath2016.conferencespot.org/62620-wpathv2-1.3138789/t001-1.3140111/f004-1.3140315/0706-000371-1.3140317.

[93] Mariska C. Vlot et al., “Effect of pubertal suppression and cross-sex hormone therapy on bone turnover markers and bone mineral apparent density (BMAD) in transgender adolescents,” Bone 95 (2017): 11–19, http://dx.doi.org/10.1016/j.bone.2016.11.008.

[94] For example, the drug Lupron is approved for treating both precocious puberty and prostate cancer, http://www.accessdata.fda.gov/drugsatfda_docs/label/2009/020263s033lbl.pdf and http://www.fda.gov/Drugs/DrugSafety/ucm209842.htm#table.

[95] Delemarre-van de Waal and Cohen-Kettenis, “Clinical management of gender identity disorder in adolescents,” S131.

[96] Ibid., S131–132.

[97] DSM-5, 455. Note: Although the quotation comes from the DSM-5entry for “gender dysphoria” and implies that the listed persistence rates apply to that precise diagnosis, the diagnosis of gender dysphoria was formalized by the DSM-5, so some of the studies from which the persistence rates were drawn may have employed earlier diagnostic criteria.

[98] Wren, “Early Physical Intervention for Young People with Atypical Gender Identity Development,” 222–223; Steensma et al., “Desisting and persisting gender dysphoria after childhood: a qualitative follow-up study,” 499–516. See also Peggy T. Cohen-Kettenis and Stephanie H. M. Van Goozen, “Sex Reassignment of Adolescent Transsexuals: A Follow-up Study,” Journal of the American Academy of Child and Adolescent Psychiatry36, no. 2 (1997): 266, http://dx.doi.org/10.1097/00004583-199702000-00017; Kenneth Zucker et al., “Puberty-Blocking Hormonal Therapy for Adolescents with Gender Identity Disorder: A Descriptive Clinical Study,” Journal of Gay & Lesbian Mental Health 15, no. 1 (2010): 68, http://dx.doi.org/10.1080/19359705.2011.530574.

[99] Cohen-Kettenis, Delemarre-van de Waal, and Gooren, “The Treatment of Adolescent Transsexuals: Changing Insights,” 1895.

[100] Ibid., 1894.

[101] Ibid.

[102] Delemarre-van de Waal and Cohen-Kettenis, “Clinical management of gender identity disorder in adolescents,” S133.

[103] Ibid.

[104] Canadian Pediatric Endocrine Group, “Pubertal blockade safe for pediatric patients with gender identity disorder,” Endocrine Today, March 2012, http://www.healio.com/endocrinology/pediatric-endocrinology/news/print/endocrine-today/{69c4c36a-37c3-4053-a856-22a27f8df62c}/pubertal-blockade-safe-for-pediatric-patients-with-gender-identity-disorder.

[105] Jenny Fernandez, “Norman Spack: Saving transgender lives,” April 24, 2015, https://thriving.childrenshospital.org/norman-spack-saving-transgender-lives/.

[106] Laura Kuper, “Puberty Blocking Medications: Clinical Research Review,” IMPACT LGBT Health and Development Program (2014), http://impactprogram.org/wp-content/uploads/2014/12/Kuper-2014-Puberty-Blockers-Clinical-Research-Review.pdf.

[107] Mitch Kellaway, “Blocking Puberty Is Beneficial for Transgender Youth,” Advocate.com, September 14, 2014, http://www.advocate.com/politics/transgender/2014/09/14/study-blocking-puberty-beneficial-transgender-youth.

[108] Andrea James, “Life Without Puberty,” Advocate.com, January 25, 2008, http://www.advocate.com/news/2008/01/25/life-without-puberty.

[109] Freda R. Savana, “Looking at suppressing puberty for transgender kids,” Doylestown Intelligencer, March 6, 2016, http://www.theintell.com/news/local/looking-at-suppressing-puberty-for-transgender-kids/article_9082cab8-c47c-11e5-8186-afa80da85677.html.

[110] Christopher P. Houk and Peter A. Lee, “The Diagnosis and Care of Transsexual Children and Adolescents: A Pediatric Endocrinologists’ Perspective,” Journal of Pediatric Endocrinology and Metabolism 19, no. 2 (2006): 108, http://dx.doi.org/10.1515/JPEM.2006.19.2.103.

[111] Murchison et al., “Supporting and Caring for Transgender Children,” 11.

[112] Cohen-Kettenis, Delemarre-van de Waal, and Gooren, “The Treatment of Adolescent Transsexuals: Changing Insights,” 1894.

[113] Delemarre-van de Waal and Cohen-Kettenis, “Clinical management of gender identity disorder in adolescents,” S131.

[114] Cohen-Kettenis, Delemarre-van de Waal, and Gooren, “The Treatment of Adolescent Transsexuals: Changing Insights,” 1894.

[115] Marisa M. Fisher, Deborah Lemay, and Erica A. Eugster, “Resumption of Puberty in Girls and Boys Following Removal of the Histrelin Implant,” The Journal of Pediatrics 164, no. 4 (2014): 3, http://dx.doi.org/10.1016/j.jpeds.2013.12.009.

[116] Silvano Bertelloni and Dick Mul, “Treatment of central precocious puberty by GnRH analogs: long-term outcome in men,” Asian Journal of Andrology 10, no. 4 (2008): 531, http://dx.doi.org/10.1111/j.1745-7262.2008.00409.x.

[117] Denise Hough et al., “Spatial memory is impaired by peripubertal GnRH agonist treatment and testosterone replacement in sheep,” Psychoneuroendocrinology 75 (2017): 173, http://dx.doi.org/10.1016/j.psyneuen.2016.10.016.

[118] Denise Hough et al., “A reduction in long-term spatial memory persists after discontinuation of peripubertal GnRH agonist treatment in sheep,” Psychoneuroendocrinology 77 (2017): 1, http://dx.doi.org/10.1016/j.psyneuen.2016.11.029.

[119] Annemieke S. Staphorsius et al., “Puberty suppression and executive functioning: An fMRI-study in adolescents with gender dysphoria,” Psychoneuroendocrinology 56 (2015): 197, http://dx.doi.org/10.1016/j.psyneuen.2015.03.007.

[120] Ibid. Male subjects whose puberty had been suppressed had lower accuracy scores than any of the groups tested (including female gender dysphoria patients, male gender dysphoria patients whose puberty had not been suppressed, and control groups of boys and girls who did not have gender dysphoria). However, the differences between the groups’ scores were not all statistically significant: the scores of the male subjects who had undergone puberty suppression were statistically significantly different from the control boys and girls, as well as from the female gender dysphoria patients whose puberty was not suppressed, but were notstatistically significantly different from males with gender dysphoria who had not undergone puberty suppression, or from females with gender dysphoria who had undergone puberty suppression.

[121] Ian Hacking, “The looping effect of human kinds,” in Causal Cognition, eds. Dan Sperber, David Premack, and Ann James Premack (1996): 369, http://dx.doi.org/10.1093/acprof:oso/9780198524021.003.0012.

[122] See, for example, B.J. Casey, Rebecca M. Jones, and Todd A. Hare, “The Adolescent Brain,” Annals of the New York Academy of Sciences 1124 (2008): 111, http://dx.doi.org/10.1196/annals.1440.010.


Tradução do artigo de Paul W. Hruz, Lawrence S. Mayer, Paul R. McHugh