alternativas além da transição
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Se já não é óbvio, disfóricos tendem a ver gênero em tudo.

Para usar um exemplo pessoal, eu costumava dizer: “Ah sim, eu sempre era o pai nas brincadeiras de casinha na infância. Eu sempre pensei em mim mesmo como um menino, realmente.” E parecia irrelevante o fato de que eu também às vezes era o cachorro ou o “bebê” aparentemente sem sexo.

Enfim, somos meticulosos, no sentido de que gostamos de ter todas as informações disponíveis, apesar do que nossas crenças específicas em relação a sexo e gênero podem sugerir.

É por isso que eu sinto que devo escrever este post – todo esse blog, na verdade. Embora não pense que, no final das contas, estou dizendo algo extraordinariamente novo, queria dividir tudo em etapas, porque considero mais fácil entender etapas do que ideias abstratas: frases como “aceite seu corpo natural” sempre pareceram um excelente incentivo, mas não faziam sentido para mim quando eu pensava que meu corpo natural estava errado.

Na época, a informação que eu queria de outras pessoas disfóricas era a de como elas pensavam: como os suas mentes genuinamente funcionavam, como elas racionalizavam seus sentimentos, como chegavam a certas conclusões, como percebiam a realidade, como era a disforia para elas. Da mesma forma, o que eu queria daqueles que destransicionavam era um guia literal, estilo receita de bolo, para reformular meus próprios pensamentos. Algumas pessoas expressavam “desconstruir a misoginia internalizada” como um primeiro passo, mas isso era muito vago para mim, na época.

Creio que é um equívoco a ideia de que pessoas que se identificam como trans acham que homens e mulheres são iguais. Pelo contrário, eu sugiro que os disfóricos percebem as diferenças entre os sexos de forma mais exagerada do que realmente são.

Exemplo:
Eu frequentei fóruns trans por um tempo. Uma preocupação comum entre os membros era a de que as pessoas “cis” poderiam descobrir que eles eram trans pelo som da urina. Agora, se você está pensando “isso é loucura, ninguém se importa em ouvir o xixi alheio, e caso alguém preste mesmo atenção, é provavelmente por estar esperando o outro sair para que ele mesmo possa fazer cocô em paz”: parabéns, você está pensando racionalmente. Entretanto, para uma pessoa disfórica, isso parece uma preocupação completamente lógica.

Nenhum sexo pode ser afirmado “melhor” ou “pior” que o outro – a natureza não vê utilidade para tais juízos de valor -, eles são apenas diferentes, mas disfóricos estão perdidos na análise. Nós, inconscientemente, exageramos os pontos “fortes” e “fracos” dos sexos, especialmente no nosso corpo. Nós não sabemos como é ser do sexo oposto, mas definitivamente não gostamos de algo nosso e, por esse motivo, talvez esperemos algo desejável do outro lado. O sexo vizinho tem a “grama mais verde”.

Nós, disfóricos, estamos sempre Putos (com P maiúsculo) pelo fato de não conseguirmos identificar nossos corpos. Atribuímos uma espécie de valor quase moral ao sexo. Atribuimos diversos significados a órgãos que não dizem respeito a uma essência subjetiva inerente, ansiamos por uma explicação para algo que a maioria das pessoas leva naturalmente. Ser “trans” é o mais próximo que alguns chegam à Grande Resposta.

Em última análise, reitero que o sexo é uma característica física como qualquer outra: tamanho, biotipo, cor, tipo sanguineo. Ele é um produto da natureza, sendo esta imparcial, insensível, impiedosa. É o resultado de muitas milhares de gerações de humanos e quaisquer criaturas que vieram antes de nós, desde o início, traçando todo o caminho de volta até o ancestral mais primordial.

Seu sexo biológico é seu direito de nascença.

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A imagem acima mostra as reais diferenças biológicas entre homens e mulheres vs. a forma exagerada como pessoas disfóricas enxergam essa diferença. Não quero, com esse exemplo, menosprezar as pessoas que se assemelham à visão disfórica, mas tais indivíduos não deveriam ser a imagem padrão ao lado da definição de “homem” e “mulher” no dicionário. Isso faz sentido?

Então você acha que conseguiu entender tudo, hein?”

Eu não sei, eu não sou uma profissional de saúde mental. Eu não sou ninguém especial. Eu sou só alguém que pensou muito e exaustivamente sobre esse assunto.

De qualquer forma, aqui está minha proposta:

1- você deve ser honesto consigo mesmo. Eu sei que isso soa como se eu não me importasse com seus sentimentos, mas eu os compreendo. Muito mesmo. Eu quero ajudar. Reconheça que a medicina moderna só pode fazer você parecer o sexo oposto. Não pode realmente transformá-lo no sexo oposto, da mesma forma que descolorir seu cabelo não faz de você uma loira natural. A disforia de gênero é, em última instância, um pensamento. Um desejo. Um desejo por algo que não pode ser alcançado. Você pode tentar de qualquer maneira, mas se não por milagre, você irá falhar. Você pode imitar, mas se não estiver satisfeito em admitir de que tudo se trata de uma imitação superficial, você vai sofrer.

2. Você precisa destruir a maneira como pensa sobre sexo e começar do zero. Reconhecer e trabalhar com suas limitações é uma parte importante da vida. É surpreendente o impacto que as palavras podem ter. É por isso que os pronomes e nomes são uma parte tão central da discussão das pessoas trans (quão esquisito é isso?).

3. Pare de pensar em si mesmo apenas e irredutivelmente como um homem ou uma mulher, como se não tivesse outras características. Sempre que você começar a refletir “nossa, olha o quanto eu sou um homem” ou se olhar no espelho e não conseguir pensar outra coisa a não ser “isso é uma mulher”, PARE. Essas palavras estão contaminadas para você no momento. Force-se a pensar “ eu sou uma pessoa” ou “eu sou um humano”.

4. Tome o passo 3 e aplique-o em seu olhar diante de outras pessoas. Se você perceber que seu primeiro pensamento sobre alguém está relacionado às características sexuais, corrija-se: ali está uma pessoa, humano, individuo. Não se confunda nem a ninguém. Apenas faça uma nota rápida na sua cabeça de que outras pessoas são, como você, antes de tudo, humanos.

5. Uma vez que você tenha uma melhor compreensão de como todos os humanos são parecidos, ai sim você pode começar a formar uma compreensão objetiva e materialista de como os sexos biológicos diferem. Comece pensando em termos de gametas e cromossomos, que eu acho que são relativamente neutros para a maioria das pessoas – espermatosóides, óvulos, XX, XY. Isso é tão mais simples que a linguagem transativista com suas “pessoas que menstruam”.

6. Lentamente comece a introduzir as palavras “macho” e “fêmea”. Pense neles apenas no sentido de que eles são uma maneira concisa de rotular uma determinada categoria de pessoas. “Eu sou uma pessoa que está na categoria reprodutiva feminina, sou fêmea” é mais fácil para uma pessoa disfórica aceitar e compreender do que um “eu sou mulher”.

Macho: o sexo que produz gametas espermatozóides, tipicamente móveis, com os quais uma fêmea pode ser fertilizada ou inseminada para produzir descendentes.

Fêmea: o sexo caracterizado por um par de cromossomos X, que pode produzir óvulos, distinguido biologicamente pela produção desses gametas, os quais podem ser fertilizados por gâmetas masculinos

7. “Homem” e “mulher” devem vir por último, visto que são os termos mais carregados socialmente falando. Mais uma vez, estes precisarão ser pensados ​​apenas no sentido de concisão. Mulher: fêmea humana adulta. Homem: Macho humano adulto. Subdefine estas palavras:

Adulto: totalmente crescido ou desenvolvido

Humano: Um mamífero primata bípede (Homo sapiens)

Macho/fêmea: definidos no passo 6.

8. Integre essas palavras de volta ao seu vocabulário. Você não precisa se identificar com elas ou ter sentimentos em relação a elas. Elas querem dizer exatamente o que querem dizer e nada mais. Se você gosta de uma palavra mais do que outra, você está se permitindo entrar em um território perigoso. Palavras são apenas ferramentas. Se você tiver um episódio particularmente ruim de disforia, a Etapa 2 é onde você deve começar.

Por fim, somos todos da mesma espécie: humanos. Tão diferentes quanto podemos ser, todos nós temos pensamentos e sentimentos muito semelhantes e muitos de nós querem as mesmas coisas. Humanos de sexo masculino e feminino não são muito diferentes, para além de seu papel reprodutivo na natureza, que não precisa necessariamente ser cumprido. Mais uma vez, seja honesto consigo mesmo. Este é um exercício de responsabilidade.

Se você não é honesto consigo mesmo, você irá falhar.

Palavra final:

Embora seja péssimo, não fique zangado com você devido à sua disforia. O objetivo não é reprimir. É um sentimento, então trate como qualquer outra emoção negativa: tristeza, raiva, frustração. Esteja ciente dela, a entenda por aquilo que é, tente descobrir de onde vem, e lembre-se de que há uma saída para isso. Eu encontro bastante conforto em simplesmente entender por que estou me sentindo de certa forma. Às vezes é éticamente justificável, às vezes não, mas isso faz parte da Experiência Humana Universal.

Seja honesto consigo mesmo, mas seja gentil também.


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