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Educação para decidir. Contraceptivo para não engravidar. Aborto legal para não morrer.

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Educação para decidir. Contraceptivo para não engravidar.

Em meio ao furor da ameaça de não podermos mais abortar nem se formos estupradas, o debate sobre o aborto legal, longe de estar ultrapassado, se torna ainda mais importante.

O direito a aborto legal sempre foi uma das principais bandeiras do movimento feminista, e deve continuar a sê-la enquanto ainda não tivermos esse direito, universalmente. Ter o direito de abortar é um exercício de autonomia que bate de frente com duas escolhas que o patriarcado não quer nos dar de jeito nenhum: a escolha de não ser mãe e a agência sobre nosso próprio corpo.

A resistência do patriarcado — e não estou nem falando aqui de religiões — a nos ceder esse direito está intimamente relacionada à origem da nossa opressão: o controle e a exploração de nossas capacidades sexuais, reprodutivas e laborativas. O início do patriarcado é marcado não pela divisão sexual do trabalho — que pode, sim, não ser opressiva — , mas pela redução da mulher à condição de commodity e à exploração de sua capacidade de fornecer ao patriarca herdeiros (para garantir a manutenção da propriedade na sua linhagem), mão-de-obra e mais parideiras.

Assim, tanto a mulher que não pode gerar e parir quanto a mulher que se recusa a fazê-lo são, aos olhos do patriarcado, inúteis. Mas a mulher que se recusa a gerar e parir tem o extra de negar o destino que, até então, lhe era certo e inexorável. Ela toma, por si, uma decisão; negando aos homens a possibilidade de fazê-lo. Que afronta!

Dados da ONU sobre o aborto em 2011.
Correção: o Chile aprovou, neste ano, a descriminalização da interrupção da gravidez em caso de risco para a vida da mãe, inviabilidade do feto e estupro.

Em termos mundiais, temos:

  • Em torno de 40 a 50 milhões de abortos feitos todos os anos. Isso corresponde à taxa de 125 mil abortos por dia.
  • Quase 50 mil mulheres morrem anualmente como decorrência de complicações em abortos clandestinos.
  • 78% de todos os abortos são realizados em países em desenvolvimento, e os restantes 22% em países desenvolvidos.
  • Em aproximadamente 97 países — com cerca de 66% da população mundial — há leis que, em essência, permitem o aborto induzido. 93 países, com 34% da população, proíbem o aborto ou o permitem em apenas algumas situações.
  • As taxas de aborto caíram significativamente na maior parte das regiões mais desenvolvidas do mundo entre 1990 em 2014, enquanto que permaneceram amplamente inalteradas nas regiões em desenvolvimento durante o mesmo período. Isso está diretamente relacionado à legalização do aborto nos países desenvolvidos. Em países onde o procedimento foi totalmente proibido ou autorizado somente em caso de risco de morte, a taxa de aborto era de 37 para cada 1 mil, e em países onde era autorizado, a taxa era de 34 para 1 mil em 2010–2014.
  • Entre 2010–2014, um quarto de todas as gestações no mundo acabou em aborto. O percentual caiu nos países desenvolvidos, de 39% em 1990–1994 para 28% em 2010–2014.
  • Por outro lado, mudou pouco nos países em desenvolvimento, de 21% para 24% no mesmo período. Contudo, a proporção de gravidez encerrada em aborto aumentou na América Latina e no Caribe (de 23% para 32%), Ásia Central e Meridional (de 17% para 25%) e África Austral (de 17% para 24%).
  • O primeiro mais no mundo a ter o aborto liberado foi… a União Soviética. Por que será?!

No Brasil:

  • Uma em cada cinco mulheres aos 40 anos já fez, pelo menos, um aborto — o que significa que 4,7 milhões de brasileiras já abortaram.
  • Em 2015, mais de meio milhão de mulheres abortou. Em 2013, mais de 150 mil mulheres foram internadas por complicações em abortos induzidos.
  • Uma mulher por minuto aborta no Brasil.
  • Diariamente, quatro mulheres morrem nos hospitais por complicações do aborto.

Apesar disso, estamos vivendo ameaças de retrocessos o tempo inteiro.

  • Tramitam no Senado nada mais, nada menos do que 11 projetos de lei que tratam do aborto. (Somente no Senado. Sem contar na Câmara.) Destes, oito pretendem aumentar as restrições atuar, e, destes 8, três projetos querem tornar aborto um crime hediondo;
  • PL 5069/2013, de Eduardo Cunha: tipifica como crime contra a vida o anúncio de meio abortivo e prevê penas específicas para quem induz a gestante à prática de aborto. Poderia ser o fim da pílula da dia seguinte.
  • PL 478/2007, Estatuto do Nascituro, de Luiz Bassuma: define o início da vida a partir da concepção (apesar de a personalidade jurídica ser adquirida somente ao nascimento com vida), conferindo ao feto proteção jurídica. Define políticas pró-natalidade. Impossibilita totalmente o aborto (uma vez que confere ao nascituro o “direito” de se desenvolver e de nascer).
  • PEC 29/2015, de Magno Malta: Altera o art. 5º da Constituição Federal para explicitar que o direito à vida é inviolável desde a concepção.

Temos de lutar não só pela descriminalização, mas pela legalização do aborto, por sua oferta no SUS e, simultaneamente, por mais políticas públicas de educação sexual, para que a mulher não precise abortar.

Não podemos baixar a guarda nunca! Lembrem-se do que já nos disse Simone:

Nunca se esqueça de que basta uma crise políticaeconômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados.