esquerda

O Feminismo identifica o patriarcado como a raiz da desigualdade social; embora a opressão exista também nos eixos étnicos, religiosos, nacionais e culturais que se sobrepõem para criar múltiplas camadas de marginalização e discriminação, todas as sociedades (com raras exceções) são construídas sobre um sistema de dominação masculina sobre as mulheres. Apesar de o termo ‘radical’ ser frequentemente interpretado como ‘extremo’ particularmente me meio político, sua etimologia é muito menos carregada, ao se tomar seu ponto crucial:

“No final de 14c, num sentido filosófico medieval, do Latim radicalis ‘das ou tendo raizes’, do radical do Latim radix (gerado de radici) ‘raiz’ (de raiz PIE *wrãd — ‘galho, raiz’). Significando ‘indo à origem, ao essencial’ é dos anos 1650. O signo radical da matemática é dos anos 1680.”

O Feminismo Radical, portanto, procura endereçar as raízes do patriarcado — por que existe e como funciona. O objetivo de qualquer sistema de opressão é a acumulação e o controle dos recursos: um grupo quer algo que o outro possui; usualmente terras, recursos naturais e trabalho. Qual recurso que as mulheres têm que os homens querem? Trabalho, certamente, mas mais fundamental é a habilidade de reproduzir a espécie. Os homens precisam de mulheres para ter filhos que possam levar adiante seu legado, cuidar deles quando estiverem idosos ou doentes, e dar honra ao nome da família — seu nome, é claro.

A acumulação e manutenção histórica do poder e do capital por homens é uma barreira massiva que as mulheres, enquanto classe, ainda lutam para superar. Mulheres têm consciência de que geralmente homens são fisicamente mais fortes do que elas. A prevalência da violência masculina contra as mulheres apresenta representa ameaça o suficiente para impedi-las de terminar relações com eles, enfrentarem-nos, e escolherem priorizar suas próprias vidas e as vidas de outras mulheres aos seus redores de maneira mais generalizada.

Mas somente a força bruta não é o bastante. Nenhum sistema de opressão é completo sem engenharia social. Aqueles sem poder não podem apenas ser convencidos de que eles não podem vencer se lutarem contra, eles têm que ser convencidos de que lutar contra é inaceitável ou impensável. Sobre o sistema de gênero, ou papéis de gênero, como é mais comumente conhecido. Gênero consiste em esteriótipos de papéis sexuais que ditam como cada sexo supostamente deve agir em relação ao outro, por exemplo, masculinidade e feminilidade. Masculinidade é a instituição social que permite ao homem ser dominador, auto-centrado e sociopata. Feminilidade, por outro lado, seduz, coage e pune mulheres e meninas para orbitar ao redor das demandas e sentimentos de meninos e homens, moldando suas aparências em relação ao olhar masculino e à cultura da pornografia, e abrindo mão de seus próprios interesses e e bem estar a fim de suprir a expectativa de que sejam gerentes e cuidadoras de todos.

Gênero permeia todas as culturas, todas as classes econômicas, todas as famílias. Independente se os genitores são liberais ou conservadores, religiosos ou ateístas, pais solteiros ou tradicionais, papéis de gênero são impostos tanto explicitamente quanto sutilmente através de recursos ilimitados. Crianças crescem assimilando o que é esperado delas baseado em seus sexos biológicos, e isso é reforçado pelas interações entre estudantes, professores, babás, vizinhos, políticos, líderes de negócios, comerciais de TV, filmes, brinquedos, roupas, música, amigos de família, parentes, etc. Ninguém escapa da lavagem cerebral sexista, não importa quão progressista a família possa parecer na teoria ou na prática, e os homens se beneficiam do sexismo não importa quão progressistas eles aparentem ser. Independentemente da educação ou das intenções individuais dos homens, eles têm um grande interesse no patriarcado e não precisam fazer nenhum esforço para exercer esse poder. Os homens nascem com ele assim como as mulheres nascem em um papel projetado para forçá-las a acomodar esse poder.

“Muitas mulheres, penso eu, resistem ao feminismo porque é uma agonia ser totalmente consciente da brutal misoginia que permeia a cultura, a sociedade, e todas as relações pessoais.”

Andrea Dworkin

-Renee Gerlich (@renee_jg) 31 de janeiro de 2019

É de se imaginar que espaços feministas (lugares onde mulheres podem se encontrar livremente sem interferência de homens) são os únicos lugares seguros para mulheres? Feminismo não é apenas para mulheres brancas, ou mulheres educadas, ou mulheres falantes da língua inglesa, ou mulheres ricas, ou mulheres convencionalmente atraentes, ou mulheres heterossexuais. Também não é apenas para mulheres liberais ou de esquerda, somente. Feminismo é para todas as mulheres, inclusive para aquelas que não se identificam como feministas, e até para aquelas cujas ideias políticas achamos repugnantes.

Recentemente, 3 feministas do Reino Unido viajaram para Washington, D.C., para conversar com todos os tipos de políticos sobre a importância de manter proteções baseadas no sexo biológico no Título IX uma vez que transativistas estão pressionando para substituir a categoria protegida de sexo para identidade de gênero. Essas mulheres são Posie Parker (também conhecida como Kellie-Jay Keen-Minshull), Venice Allan (também conhecida como Dr RadFem), e Julia Long. Houve um tumulto, porque Posie e Júlia enfrentaram dois indivíduos, um dos quais é Sarah McBride, um homem que se identifica como mulher e é o Secretário Nacional de Imprensa da Campanha de Direitos Humanos. McBride está fazendo lobby com o governo dos EUA para eliminar as proteções baseadas em sexo biológico. Natasha Chart explica o contexto da campanha:

“McBride estava lá aquela manhã para argumentar que garotas em escolas não têm direito à privacidade quando estão trocando de roupa para a aula de educação física ou para lidarem com sua menstruação no que deveriam ser banheiros só para garotas. McBride estava lá para pedir o fim dos esportes femininos, porque eles querem que garotos participem dos times das garotas. McBride estava lá para dar uma reviravolta nas décadas de luta por direitos femininos, à frente de um movimento que brutalmente silenciou as mulheres que discordam.”

Posie postou um vídeo de sua interação com McBride que foi instantaneamente denunciado por organizações e sites LGBTQ+ como Gay Star News e PinkNews como um incidente chocante de humilhação e transfobia. Vamos ver se a interpretação deles é justa e acurada:

https://youtu.be/ekjiSliteKU

Primeiramente, que direito os homens têm para distorcer os direitos das mulheres para serem reconhecidos como uma classe de pessoas com desafios e necessidades únicas? Que direito tem qualquer grupo de dizer a crianças de que elas nasceram erradas e de leva-las a fazer procedimentos médicos e cirúrgicos perigosos e permanentes enquanto lutam para negociar papéis de gênero? Não é surpreendente que organizações que apoiam ideologia de gênero caracterizem esse encontro sob uma luz desfavorável. Mas o que me manteve acordada nessa última semana tem sido a maneira como feministas proeminentes se viraram contra Posie e Julia, acusando-as de promover uma embaraçosa emboscada, causando danos e declarando a essas feministas uma responsabilidade. Essas críticas não são de feministas liberais. Elas vieram de feministas que se opuseram vocalmente às bobagens de gênero e tiveram a coragem de dizer que mulheres são fêmeas humanas adultas e nada mais.

O que eu vejo nesse vídeo são dois homens que odeiam mulheres sendo muito bem pagos para reverter conquistas feministas usando o nome dos direitos humanos e política progressista. Eu vejo duas mulheres aproveitando uma oportunidade e pedindo que esses homens sejam responsáveis. Elas não os xingaram. Elas não os amaldiçoaram. Elas não gritaram. E se prestar atenção, a primeira coisa que McBride faz é virar a cara e ignorar essas mulheres assim que elas entram. Mesmo assim ele está sendo tratado como vítima. Alguma coisa não está certa sobre isso tudo. Eu percebo que Posie fez comentários controversos no passado, mas isso não significa que tudo o que ela fez está errado. Isso me parece uma tentativa de feministas populares que se opõem à auto-declaração de gênero se livrarem de feministas que elas consideram problemáticas enquanto elas ganham reconhecimento na política mainstream.

Eu me pergunto se a real controvérsia aqui é o fato da Women’s Liberation Front (WoLF) ter organizado uma campanha aliada com organizações conservadoras que se opõem a auto-declaração de gênero. Outra coalizão feminista, Hands Across de Aisle, também não se recusa a trabalhar com pessoas da direita que defendem limites de meninas e mulheres, e que reconhecem sexo biológico como legalmente, socialmente e materialmente significante para as vidas de mulheres. Isso inclui mulheres de famílias e comunidades conversadoras. Da mesma forma, crianças de todas as esferas de vida têm o direito de serem protegidas, independentemente do enquadramento político dos adultos a seu redor. Progressistas gostam de pensar que os conservadores são pessoas brutas que não se importam com mulheres, e a maioria deles não se importa mesmo, mas tampouco se importam os progressistas. Então liberais apoiam o direito ao aborto. Isso é fácil. Homens da esquerda apoiam o aborto porque se beneficiam dele; isso significa que talvez eles não tenham que assumir a responsabilidade caso engravidem uma mulher:

“O Direito Cristão se opõe aos direitos de aborto. Mas eles também se opõem à prostituição, sadomasoquismo, e eles sabem que crianças não devem ser cobaias e que mulheres são fêmeas. Será um dia frio no inferno antes que feministas encontrem um aliado ‘puro’.”

Lavender Blume

Liberais apoiam o comércio sexual, pornografia e barriga de aluguel — todas essas indústrias exploram mulheres. Foi sob um governo conservador liderado por Stephen Harper que se implementou o Modelo Nórdico no Canadá, como alguns países liberais fizeram. A esquerda, usualmente constituída pelo Greens, NDP e o Labour, tem sido o lar de misóginos que desejam abolir a palavra “woman” (mulher) e substituir por “womxn” (eles não parecem se importar com a palavra “man” — homem — interessantemente). São os liberais os responsáveis por dar prêmios e posições a homens que se identificam como mulheres, ao invés de mulheres biológicas. São os liberais que dão os parabéns para homens competindo nos esportes femininos e roubando as medalhas delas. São os liberais que se cegaram para casamentos arranjados, casamento infantil, mutilação genital feminina, assassinatos “em nome da honra”, ataques de ácido. São os liberais que abraçaram palavras como “TERFs” e “cis”. São os liberais que dizem que práticas de beleza feminina são assuntos de escolha pessoal e empoderadores.

Feministas que criticam mulheres por trabalharem com conservadores não parecem se dar conta de que não existe algo como um aliado puro. Não importa onde se procura apoio, ou a organização com a qual se está trabalhando — a não ser que seja um grupo feminista radical — vão te dar apoio em alguns lados enquanto minam de outros. Não foi sempre esse o caso? Até os partidos que se dizem se centrar em mulheres expulsam aquelas que dizem que homens não podem ser mulheres e que mulheres são oprimidas devido a seu sexo biológico. Eu entendo porque é controverso dar palestras em eventos promovidos por grupos como o Heritage Foundation (fundação conservadora dos EUA) e eu sempre questionarei qualquer mulher que se sinta confortável em fazê-lo. Eu entendo. Mas mesmo nesse clima hostil, eu penso que significa muito uma fundação que se opõe a direitos de gays convidar feministas radicais para compartilhar seus pontos de vista, enquanto que a esquerda tenta silenciar qualquer feminista radical em qualquer chance que tenha.

Como vamos advogar pelas mulheres se nem podemos definir o que uma mulher é? Como vamos apoiar lésbicas se não podemos definir orientação sexual tomando por base sexo biológico? Os esquerdistas que evitam as mulheres que trabalham com outras pessoas sobre determinados assuntos são hipócritas que sempre odiaram as mulheres. Se eles se importassem, eles teriam ouvido em primeiro lugar, e não forçado mulheres a procurarem apoio em outros lugares.


Texto Original de Lavender Blume pode ser lido aqui.