Discriminações e desigualdades sexuais no mercado de trabalho

No Brasil, é praticamente impossível falar de desigualdade econômica sem também frisar que isso implica em racismo estrutural: a parcela mais empobrecida da população feminina compõe também uma grande parcela da população feminina negra (preta ou parda) do país.

Pessoas negras (pretas ou pardas) — ou seja, homens e mulheres — já ganham menos relativamente a pessoas brancas; e mulheres negras têm menores rendimentos do que homens brancos, também. Assim, a população feminina negra é a mais vulnerável do país.

Segundos dados do IBGE, a população negra é a que mais tem restrições de acesso a educação, sendo que homens negros têm mais restrições do que mulheres (por entrarem mais cedo no mercado de trabalho — a evasão escolar entre jovens negros é maior do que entre jovens negras, resultando em mulheres negras terem uma média de anos de estudo maior do que de homens negros. E enquanto a proporção de pessoas brancas com 9 a 11 anos de estudo no Brasil seja muito próxima àquela de pessoas negras (uma média de 29,3% de pessoas brancas para 29,2% de pessoas negras), os números caem pela metade ao se analisar a população com 12 ou mais anos de estudo (correspondente às pessoas com ensino médio completo, no mínimo) — enquanto 25,9% das pessoas brancas têm 12 ou mais anos de estudo, apenas 12% da população negra o tem.

Naturalmente, o tempo de estudo impactará nas oportunidades de trabalho — e na qualidade do trabalho e do acesso aos direitos trabalhistas e previdenciários. A população com menor educação formal está sujeita a se contentar com trabalhos precários, informais, e/ou domésticos — tanto é que a população negra é a que mais executa trabalhos domésticos no país.

A escolaridade também afeta na inserção (e na continuidade) no mercado de trabalho após a maternidade: quanto menor a escolaridade, maior a proporção de mulheres que são afastadas do emprego doze meses após a o início da licença-maternidade. Foram afastadas 51% das mulheres com ensino fundamental incompleto; 53% das mulheres com fundamental completo; 49% das mulheres com ensino médio completo e 35% das mulheres com escolaridade acima do ensino médio.

As mulheres, de forma geral, também apresentam jornadas de trabalho menores do que os homens, de 30h semanais, principalmente pelo fato de não terem com quem deixarem suas crianças (o número de creches públicas ainda é muito pequeno comparado à demanda, e, como as creches dependem do município para serem criadas, as mulheres ficam à mercê das decisões políticas e mercadológicas de cada gestão do governo de sua cidade), além de serem as principais responsáveis pelos cuidados da família (não só de crianças, mas comumente também de pessoas idosas) e da casa. Mulheres são as chefes de família de quase metade dos lares brasileiros, sendo que o arranjo familiar em que mulheres mais comumente são chefes de família é justamente o de mulher com filhos (que em 2015 correspondia a 40% dos arranjos em que há mulheres). Em contraste, a formação familiar de homens com filhos corresponde a apenas 3,7% dos arranjos com homens presentes. A parentalidade e os trabalhos domésticos são fardos praticamente exclusivos da mulher, sendo que mulheres dedicam 2,5 vezes mais horas de suas semanas aos afazeres domésticos do que os homens; o que tem influência direta na quantidade de horas que a mulher pode trabalhar na semana, e, consequentemente, em sua renda mensal.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a diferença média entre os salários de homens e mulheres no país, para quem trabalha 40 horas por semana, é de 20,32%. Os últimos dados mostram que as brasileiras ganham, em média, 76% da renda dos homens. A empresa Catho também fez, em 2017, um levantamento sobre desigualdade salarial entre os sexos no Brasil, constatando que as mulheres ganham menos do que os homens em todos os cargos, do estágio até a gerência. A pesquisa lista as médias salariais de homens e mulheres em 28 áreas de atuação. Os homens têm salários mais altos em 25 carreiras e as mulheres só recebem mais em três.

Assim, a escolarização e a profissionalização se encontram na base dos problemas de desigualdade, mas não só: a falta de serviços públicos que desonerem as mulheres de tarefas tipicamente de sua responsabilidade (como o cuidado de crianças e de idosos, por meio de creches públicas e casas de cuidado) também impede seu desenvolvimento. Por fim, há ainda a questão cultural e estrutural de que vivemos em uma sociedade patriarcal (e racista): mulheres ganham menos do que homens pelo mesmo trabalho; mulheres têm menos chances de serem contratadas (por conta do “risco” de engravidarem, sendo que em diversas entrevistas de emprego é perguntado se a mulher “pretende engravidar”, apesar de isso ser vedado por lei); após a licença maternidade, a evasão do mercado de trabalho ainda é muito grande (ou seja, a licença maternidade não está sendo tão efetiva em manter as mulheres no mercado de trabalho).