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Trabalho doméstico, Reprodução e Libertação da Mulher

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Trabalho doméstico, Reprodução e Libertação da Mulher

Salários para o trabalho doméstico?

  • Esses textos são uma resposta à campanha por Salários para o Trabalho Doméstico, de Silvia Federici. A leitura do original não é necessária para a compreensão dos textos, mas recomenda-se. Pode ler traduzido aqui: Salários Para e Contra o Trabalho Doméstico

Introdução por Kathy Scarbrough e Carol Hanisch (Redstockings)

Quando o Movimento de Libertação da Mulher começou, no final da década de 1960, o trabalho doméstico estava logo a seguir às questões sobre sexo enquanto uma área de discussão sobre o que as mulheres queriam mudar em nossas vidas. O resultado foi a exigência de que os homens dividissem as tarefas domésticas/cuidados das crianças e que o governo fornecesse cuidados infantis 24 horas por dia.

Betty Friedan escrevera sobre a situação da dona de casa de renda média/alta em 1963 no seu livro A Mística Feminina. Documentos de posição feminista radical que falavam sobre as tarefas domésticas abriram caminho do movimento inicial até serem publicados nas principais revistas e antologias de livros, e às vezes no mundo todo. Entre eles, estava a parte de Bev Jones, co-autora de “Rumo a um Movimento de Libertação das Mulheres” (1968, também conhecido como “The Florida Paper”), que colocou na reta um olhar não-romantizado sobre as tarefas domésticas e os cuidados infantis e defendeu que as mulheres isoladas se unissem para mudar sua situação. No seu encalço, em 1969, veio “As Políticas do Trabalho Doméstico”, escrito por Pat Mainardi, da coletiva Redstockings, contra os estratagemas que os homens usam quando confrontados com a demanda de que eles façam sua parte.

Reveladores, cruciais e populares como eram esses escritos, o que faltava era a teoria que encaixava o trabalho feito em casa numa compreensão mais ampla de seu lugar na produção/reprodução, na e pela sociedade como um todo, particularmente no sistema capitalista sob o qual vivemos. Não sabíamos então até que ponto as mulheres socialistas/comunistas na era dos anos 30 tinham abordado esta questão, muitas vezes a custo pessoal (e provavelmente ainda não sabemos a extensão total, mas Kate Weigand discutiu algumas destas batalhas iniciais em seu livro Feminismo Vermelho). O terrorismo anticomunista daquilo que ficou conhecido como a Era McCarthy nos privou de grande parte desta importante teoria. Só estavam à par aqueles com acesso a livros que incluíam mulheres escritoras comunistas daquela época ou que sabiam através da família ou amigos dos debates internos que tinham acontecido na Esquerda. Se soubéssemos mais, é possível que o MLM tivesse avançado mais rápido e talvez tivesse evitado algumas das armadilhas que assolaram o Movimento.

Muitas mulheres passaram a esperar que seus companheiros dividissem o trabalho doméstico e o cuidado das crianças, mas — além da resistência dos homens — encontraram limitações na estrutura de como o trabalho é feito no capitalismo, onde os proprietários administram o local de trabalho público para maximizar os lucros, não para atender as necessidades das pessoas que trabalham, e certamente não as necessidades dos pais e mães da classe trabalhadora. Estamos também cientes de que os tempos mudaram ligeiramente e que hoje muito mais lares são chefiados por mulheres.

Algumas de nós agora estamos tentando alcançar e compreender e usar esta teoria do passado em nosso pensamento atual, mesmo quando encorajamos as jovens feministas de hoje a olhar para as ideias do passado para seguir em frente no seu próprio tempo. O aprendizado feminista, sabemos agora, é vitalício.

Este blogzine nunca pode substituir um exame completo do material existente sobre o trabalho doméstico, mas podemos fornecer algumas peças que achamos especialmente úteis na esperança de estimular outras a se juntarem ao pensamento neste sentido. O trabalho doméstico pode não ser tão atraente quanto as “questões de sexo”, nem parecer tão imediatamente atraente quanto os direitos ao aborto ou a necessidade de parar o estupro, mas a compreensão dessa raiz da opressão das mulheres para formar uma estratégia para tirar as mulheres de seu fardo injusto proporcionará uma base teórica para outras áreas da vida das mulheres também.

Começamos com a “Parte 1: Salários para o Trabalho Doméstico…” — conjunção de dois artigos do Meeting Ground publicados em 1977. Ambas as autoras discordam dos tais salários como solução que foi defendida por algumas feministas para o trabalho não-remunerado das mulheres no lar.

Como estamos entre aquelas que acreditam que a opressão da mulher está enraizada em nossa capacidade reprodutiva, vamos recuar ainda mais nas próximas semanas para disponibilizar alguns dos debates reprimidos dos anos 60 e 70, com a intenção de reacender o interesse em chegar a uma posição feminista mais avançada sobre o trabalho doméstico, a criação de filhos e o cuidado infantil: a reprodução em seu sentido mais amplo.

* * * * *

SALÁRIOS PARA O TRABALHO DOMÉSTICO: UMA DISSIDÊNCIA

por Irene Osborne [Reimpresso do Ponto de Encontro nº 1, janeiro de 1977]

O trabalho doméstico é opressivo porque é obrigatório para as mulheres e isento para os homens. As mulheres fazem as tarefas domésticas para toda a sociedade. Todo homem cresce sabendo que pode ter uma mulher “fazendo sus refeições, cuidando da roupa e da casa durante toda sua vida, e isto sem nenhum mérito especial de sua parte, simplesmente como seu direito natural como homem”. É um detalhe a mais que esse trabalho não seja remunerado, mas certamente não seria gratuito se não fosse compulsório. Organizar o pagamento sem afetar esta condição fundamental de ser compulsivo pode muito bem piorar a situação.

Se as mulheres forem pagas pelo trabalho doméstico, será menos provável que empreendamos uma rebelião como deve ser contra a sua imposição ligada ao sexo, menos capazes de fazer com que os homens assumam qualquer responsabilidade por ele, menos impelidas a procurar emprego no mercado de trabalho. Se conseguíssemos eliminar a noção de que o trabalho doméstico é “gratificante” para mulheres, prontamente poderíamos substituir a ideia de que este é um bom caminho para a estabilidade financeira!

Que grande refúgio essa ideia seria para o conceito de que as mulheres não “precisam” de trabalhar ou não “precisam” de salários iguais…! Os salários para o trabalho doméstico serão outro dos subornos que manterão nossa potencial militância sob controle. Mesmo que os ganhos fossem adequados, os salários pagos pelo Estado para as tarefas domésticas seriam contrarrevolucionários por este motivo apenas.

E quem acredita que eles seriam adequados?

Se, invés de emancipação, tivéssemos ‘recebido’ subsídios obrigatórios para os escravos, eles ainda seriam escravos, não é mesmo?

Há um ponto substancial nessa questão que é se os salários para o trabalho doméstico realmente colocariam dinheiro nas mãos das mulheres. Em quantos casos o salário terminaria nos bolsos dos maridos, da mesma forma que os ganhos das prostitutas vão para os cafetões? Será que as mulheres agora terão que usá-lo para se alimentar, porque o homem será então mais livre para usar os ganhos dela para os seus próprios prazeres?

Dada a situação da mulher casada ou que coabite com um homem, seu salário se tornará um subsídio para os homens enquanto ela continuará a ser a serva universal?

Estejamos também cientes de que um sistema de pagamentos feitos pelo Estado estabelecerá a base perfeita para que o trabalho da mulher em casa seja “inspecionado”, avaliado, supervisionado, sob ameaça de retenção de dinheiro. Será que um trabalhador do governo ou seu próprio marido poderá denunciá-la como delinquente em seu “trabalho”? Não diga que isso não pode acontecer. Sabendo sobre a bisbilhotice do governo relativamente ao movimento das Mães pelo Bem-estar Social (Wellfare Mother), conhecendo a extensão do abuso de mulheres casadas, como podemos duvidar disso?

Há quem diga que o conceito de salário para trabalho doméstico é tão radical que isso não pode acontecer. Eu discordo. O grande perigo é que isso pode acontecer. É natural que uma plataforma liberal possa parecer a favor da mulher, prontamente apoiada por grupos de trabalho dominados por homens, satisfeitos de evitar a concorrência das mulheres, e prontos para fazer esse acordo por muito menos da metade de um pão.

Os salários para o trabalho doméstico não chegam à raiz da questão e, portanto, não são nada de radical. Isto é um reformismo de um tipo perigoso. Como feminista, não posso apoiá-lo.

Originalmente impresso em “Tell-a-Woman”, em Abril de 1976.

* * * * *

SALÁRIOS PARA O TRABALHO DOMÉSTICO: UMA SEGUNDA DISSIDÊNCIA

por Hodee Edwards [Reproduzido no zine Meeting Groud nº 2, maio de 1977]

Sua reprodução da contribuição de Irene Osborne no “TELL-A-WOMAN” de abril de 1976 foi muito bem-vinda. Gostaria de acrescentar minhas próprias observações em apoio às dela, através das quais, espero, seja uma “análise de classe”. Karl Marx fez tal análise para os trabalhadores assalariados; mas ninguém, que eu saiba, jamais fez isto para a escravidão feminina.

Antes de iniciar minha análise, gostaria de sugerir que praticamente todas as campanhas realizadas pelo Movimento de Libertação das Mulheres do mundo ocidental são para demandas aplicáveis principalmente às mulheres do Ocidente; tal como o direito ao aborto, a [reivindicação] de salários para o trabalho doméstico é outra dessas demandas: não poderia fornecer qualquer tipo de solução para as mulheres do mundo.

[Quando o MEETING GROUND expressou objeções ao parágrafo acima, a autora enviou o seguinte esclarecimento:

“Concordo plenamente que nossa campanha contra os saltos altos e cintas-ligas faziam referência às amarrações de pés em outros lugares. Gostaria de ver algum tipo de reconhecimento explícito de que entendemos que questões que levantamos pertinentes a nossas vidas não são necessariamente universalmente aplicáveis em todos os casos; que não estamos esperando que nossas irmãs do Terceiro Mundo façam campanha pelo aborto se elas preferirem fazer campanha contra a esterilização involuntária. Tenho certeza de que, como mulheres, estamos universalmente de acordo; mas devido às contradições entre as condições reais das mulheres do Terceiro Mundo em oposição às das esposas e irmãs dos aristocratas do trabalho no Ocidente, gostaria de ver esse acordo explicitado em vez de deixado implícito].

Contudo, acredito ainda que esta demanda não nos forneceria uma solução nem mesmo para os nossos problemas básicos. Irene Osborne afirma de forma bastante casual que “mesmo que os ganhos (das mulheres) fossem adequados, os salários pagos pelo Estado para o trabalho doméstico seriam contrarrevolucionários”. (Minha ênfase -HWE). Por que salários pagos pelo estado?

De acordo com a obra-prima de V. l. Lenin, “O Estado e a Revolução”, o Estado é visto principalmente em leis, prisões, militarismo e polícias; obviamente, o que se entende aqui é “o Governo”, uma parte pequena e nem sequer significativa do Estado. Nós mulheres podemos esperar realisticamente que o Governo, que serve aos grandes monopólios, nos pague salários?

Mas vamos começar pelo início.

Exatamente o que são salários? Quem os paga? Pagam pelo quê?

Vou com a definição de Karl Marx, aceitando-a como científica; isto é, baseada nos fatos. Marx disse que os salários representam custos “socialmente necessários” (isto é, consistentes com o estado existente de tecnologia social) de todas as mercadorias (como aluguel, mantimentos, contas médicas, roupas, educação) necessárias para levar os trabalhadores às máquinas para produzir. Em troca do recebimento desses custos, os trabalhadores dedicam sua energia, sua capacidade de trabalhar, ao comprador dessa energia ou dessa força de trabalho, por um tempo acordado. Em resumo, o que os trabalhadores vendem é a sua força de trabalho, sua capacidade de trabalhar. Eles a vendem para um patrão, que a utiliza pelo tempo combinado. Esse patrão é dono das máquinas em que as mãos contratadas operam E TAMBÉM dos resultados daquilo que foi produzido com o gasto da energia que foi comprada.

Portanto, é o PATRÃO — NÃO O ESTADO — quem paga os salários. A única situação em que o governo paga salários é quando contrata trabalhadores para um setor ou serviço que realmente executa. Certamente não se pode esperar que pague salários a pessoas que estão trabalhando para outra pessoa.

OK. Então, para quem a dona de casa trabalha? Para o Estado? Mas nem se imaginarmos com muita força! Ela trabalha para o patrão, ou seja, para os homens em nome dos quais ela realiza as tarefas domésticas — e para os filhos dele. Assim, seria ao marido, e somente a ele, que teríamos de direcionar qualquer demanda por salários para o trabalho doméstico.

E ele pagaria esse salário de que fundo?

Em sua análise dos salários, Karl Marx observou que os salários de um homem incluem um “incremento” para a manutenção de subsistência de uma esposa e filhos (ao provar isso, ele inadvertidamente definiu a classe trabalhadora como MASCULINA). Com esse incremento incluído em seus salários sempre mais altos, o trabalhador masculino mantém sua esposa enquanto ela está em casa realizando tarefas domésticas. Assim como o proprietário da plantação era forçado a manter seus escravos na plantação, o marido também deve manter a esposa enquanto ela fica em casa. Esta é uma manutenção bastante análoga às condições dos escravos; certamente não é um salário, mesmo quando parte dele escorre para ela na forma de dinheiro.

Eis por que, enquanto durar o sistema capitalista, os salários dos homens SEMPRE serão mais altos do que os das mulheres. A dona de casa sabe, por amarga experiência, a dificuldade de espremer qualquer dinheiro, mesmo que seja necessário, do “papai”. Ela recebe, em geral, o que o capricho dele decide. Você consegue imaginar forçar esse homem, que até agora manteve uma esposa e filhos usando seu próprio “incremento”, concordando em pagar salários diretos pelo trabalho dela?

Mesmo quando o governo paga às mulheres algum tipo de subsídio, como para as mães solo, está apenas — e apenas parcamente — substituindo um homem ausente. O que é tão mesquinhamente distribuído a essas mulheres consiste apenas na parte do salário do homem que normalmente seria atribuída ao homem para a subsistência da esposa e dos filhos. Portanto, novamente, se houvesse um homem na casa onde o trabalho doméstico estivesse sendo realizado, nenhuma desculpa poderia ser dada sobre porquê o Governo deveria pagar salários às mulheres que realizam trabalhos domésticos para homens individualmente capazes de apoiá-las.

Esse fato sobre os salários dos homens mostra novamente porque a demanda por salários para o trabalho doméstico não é possível de ser alcançada dentro do sistema existente. E conquistar isso seria tão desejável quanto reivindicar salários para os escravos nas plantações. O que precisa ser feito é esmagar a plantação e encontrar outra maneira de cultivar.

Esse obstáculo ao mote “Salários para o Trabalho Doméstico” se torna ainda mais claro quando pedimos que salários sejam pagos. Simplesmente, eles são pagos para manter os trabalhadores produzindo, para garantir que retornem todos os dias para repetir o desempenho lucrativo do dia anterior.

Portanto, se fossem pagos salários pelo trabalho doméstico, o único objetivo seria manter a mulher produzindo — seja lá o que ela produz, algo que veremos em breve. Mas o aumento de subsistência que já é pago nos salários dos homens faz exatamente isso. Para que o marido comprasse a força de trabalho da mulher pagando seu salário em dinheiro, ela teria de ser, como o foram os assalariados quando a industrialização começou, separada de suas ferramentas; isto é, da casa dela. Ela se tornaria uma trabalhadora “livre” de qualquer ônus, como uma casa, e poderia ser obrigada legalmente a fornecer sua própria comida, roupas e abrigo com os salários pagos, além de continuar produzindo. De escrava doméstica, ela seria “promovida” a trabalhadora “livre”. Ela ainda estaria à vontade e à mercê do mesmo homem; anteriormente, seu dono; agora, seu empregador.

Em seu clássico “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, Frederick Engels afirmou especificamente que, na família burguesa, marido e mulher se mantinham no mesmo relacionamento que o capitalista e o proletário.

Qual é a relação entre capitalista e proletário? O primeiro explora o segundo. Mais especificamente, o patrão toma para si, em virtude de ter comprado a força de trabalho dos trabalhadores, todas as mercadorias que esses trabalhadores produzem — e ele continua a possuir as máquinas nas quais aquelas são produzidas.

A dona de casa produz qualquer mercadoria (isto é, bens produzidos para venda primariamente e não principalmente para uso) que o marido, o capitalista da família, desapropria para si mesmo?

Quando o capitalismo estava apenas começando a existir, a família havia sido por muito tempo uma unidade de produção econômica. A esposa fazia roupas, alimentos e muitos artefatos usados pela família. À medida que o capitalismo se desenvolveu, esses produtos foram removidos do domínio do trabalho da dona de casa para o da produção social (em larga escala, industrial). Por isso, disseram os economistas, a dona de casa deixou de produzir valores.

Quando a produção dos valores de uso foi removida da casa para o mercado, surgiu uma nova mercadoria (com uma característica peculiar): a força de trabalho. No entanto, Karl Marx uma vez apelidou o trabalho doméstico de “serviço doméstico insignificante individual que não produz mercadorias”. Foi o próprio Marx, no entanto, que se esforçou bastante para provar que a força de trabalho era uma mercadoria; isto é, é levado pelo proprietário ao mercado e vendido pelo maior lance; é um valor real. Além disso, é a única mercadoria de propriedade dos trabalhadores.

Aqui, então, está a mercadoria que os trabalhadores precisam vender. Ela tem um valor real, caso contrário não poderia ser vendida. Já definimos esse valor. Valores reais não são produzidos por Deus, mas pelas pessoas. Quais pessoas produzem a mercadoria da força de trabalho, as crianças? EXATO! Ninguém mais além da dona de casa que ‘não produz’. Que o consumo supostamente improdutivo em casa, tornado possível pelo “trabalho doméstico individual mesquinho” da dona de casa, apenas garante o surgimento da força de trabalho crucial das mercadorias [1], acho que é chegada a hora das mulheres que produzem essa mercadoria estudarem, dissecá-la e ajustá-la à estrutura econômica existente, antes que possamos decidir sobre o objetivo que libertará as mulheres que a produzem.

Vamos examinar agora de que maneira a força de trabalho das mercadorias é produzida. De uma maneira bem diferente daquela de todas as outras mercadorias no sistema capitalista:

(a) por métodos arcaicos e inúteis;

(b) os chamados “dispositivos de economia de trabalho” para o lar não perturbem o método de produção aparentemente nuclear; e

(c) é produzido não em grandes fábricas, mas em células individuais chamadas lares, o que faz com que pareça ser produzido em particular.

Considero altamente significativo que o método nuclear de produção de força de trabalho seja tão caro aos corações da classe dominante. No entanto, um momento de reflexão deixa claro que a aparente nuclearidade dessa produção é, na verdade, apenas um disfarce para a natureza SOCIAL do trabalho. Nenhuma pessoa sozinha, que sai diariamente para trabalhar a partir de uma célula econômica nuclear, vale um tostão furado para a classe capitalista. O que sai de todas essas casas todos os dias é uma classe; a saber, a classe trabalhadora.

Portanto, a produção de força de trabalho é, como todas as outras produções em nossa sociedade, uma função social. O que seu confinamento nuclear realiza é impedir que a classe de escravos que produzem a mercadoria se una para destruir sua própria escravidão. Alcançar a demanda por salários para o trabalho doméstico congelaria virtualmente essa nuclearidade da produção de força de trabalho. Esse é mais um motivo pelo qual o slogan é reacionário e indesejável para a causa das mulheres.

Penso que esta análise sugere que precisamos encontrar outra maneira de obter a força de trabalho produzida. A família nuclear, como tal, pode continuar indefinidamente como um campo para garantir relacionamentos pessoais. Mas, como local econômico de produção, como cenário, onde a principal força de trabalho das mercadorias é produzida, ela deve ser esmagada. O trabalho doméstico deve, exatamente como o #MANUAL DA TRABALHADORA DOMÉSTICA” diz, fazer parte da produção social; deve se tornar uma indústria como qualquer indústria que produza qualquer outra mercadoria. Não deve mais ser o domínio exclusivo de um sexo.

Considerando a participação que a classe dominante tem até agora em combater apenas metade da população e considerando a participação que os homens, como classe que possui mulheres e possui a força de trabalho que as mulheres produzem, têm no cenário familiar existente, parece-me claro que descobrir como implementar as tarefas domésticas em um setor público é a chave para o futuro das mulheres.

Mas, para mim, essa tarefa está em contradição direta com a demanda restrita e atrasada: “Salários para o trabalho doméstico”.

[1] Estou perfeitamente ciente de que “consumo produtivo” tem um significado especializado na terminologia marxista. Penso que aqui, nós, as vítimas, temos que desafiar as autoridades e arrancar essa terminologia estéril deles. Além disso, deixo aqui de fora a questão das mulheres trabalhadoras que são contratadas por salários. Nesse ponto, elas se tornam — durante a parte do tempo que trabalham nisso — parte da classe trabalhadora. Defendo essa posição porque acho claro que, mesmo que a maioria das mulheres trabalhasse ou fosse metade ou mais da metade da classe trabalhadora, ainda consideram como se elas não estivessem fazendo seu PRINCIPAL trabalho na máquina; que elas o fazem quando vão para casa. Se as crianças ficam doentes ou alguém tem que esperar pelo homem do gás, todos sabemos qual trabalhador vai para casa fazer isso.

Traduzido da publicação no Meeting Ground Online, por Aline Rossi | Feminismo Com Classe