feminismo
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Reconhecer e expor a raiva que sentimos também são atos de resistência.

Ilustração: Redbubble

Esse é um texto de desabafo. No dia 16 de setembro deste ano, tornei-me colaboradora da QG Feminista, para a qual tantas vezes recorri durante o meu percurso na teoria radical e frente às descobertas que me foram possíveis por meio desta. Confesso que imaginei que a minha primeira postagem seria sobre algum tema que julgo ser de extrema relevância: indústria pornográfica, saúde mental da mulher, relacionamentos abusivos, maternidade compulsória, dentre outros. Porém, precisei transformar esse texto em um convite.

Imagine a cena: uma mulher sentada frente a uma pilha de livros e a um computador, tentando escolher qual assunto deveria ser abordado em sua primeira publicação em uma revista pela qual há muito tempo nutre admiração. Essa era eu alguns instantes antes de aceitar que precisava fugir do “mais do mesmo” e trocar os vocábulos com os quais sou familiarizada pelo meu mais alto e sincero grito. Imersa nas questões socioculturais que assombram a existência das mulheres, simplesmente me vi coberta de raiva. Uma fúria que você certamente tem, mas talvez não permita sentir com tanta frequência por ter aprendido a reprimi-la. Meu convite é, portanto, um chamado à libertação: vamos dar vez à nossa raiva!

Legitimar a minha mais profunda fúria é um ato novo. Afinal, somos todas apresentadas ao estigma de “mulher-maravilha”, aquela que passa por todo tipo de situação sem reclamar de nada ao final. No entanto, não verbalizar a nossa revolta não faz com que ela deixe de existir. Ao contrário: guardar nossas dores também é impedir que outra mulher se identifique com elas. Expô-las é um ato de autoridade e de empatia, simultaneamente.

Assim sendo, declaro a minha raiva diante da opressão vivenciada por cada uma de nós — cada qual dentro de seu recorte histórico, social e/ou étnico. Fingir que esse sentimento não existe é permitir que o patriarcado nos mantenha no lugar em que ele sempre fez questão que estivéssemos: o de subjugadas, caladas e reprimidas. Precisamos compreender que está tudo bem não estar sempre bem. O mundo em que vivemos sequer é propício para que vivamos assim, tão felizes quanto tentamos, por vezes, parecer. 

Já lidamos a todo o segundo com o peso dos paradigmas que tentam nos enfiar goela abaixo desde o momento em que descobriram a existência do nosso órgão sexual e da nossa (possível) capacidade reprodutora. Não precisamos — nem devemos — carregar o fardo de conter um sentimento tão natural quanto a raiva. Os padrões de gênero não fazem parte de nós; já a angústia e o sofrimento são características determinantes da condição humana, tal qual já era dito desde a modernidade pelos grandes filósofos alemães. Reitero, por fim, o meu convite: que nos dispamos daquilo que eles nos forçam a vestir e passemos a nos revestir com a nossa mais vívida fúria. Ela também é um ato de resistência.

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